Gampopa
O precioso ornamento da Liberação
Homenagem Preliminar
ʺHomenagem ao nobre Manjusri, o jovem
príncipeʺ
Rendo homenagem aos Vitoriosos e seus filhos, do
Santo Dharma e do lama,
que é a fonte deles. Com base na bondade do senhor
Milarepa, para meu bem e dos
outros, escrevi este Precioso Dharma, semelhantes à
jóia que realiza os desejos.
Introdução
De maneira geral, todos os fenômenos estão no
samsara ou no nirvana.
A natureza do samsara é vacuidade, sua manifestação
é ilusão e sua característica é o surgimento do sofrimento.
A natureza do nirvana é vacuidade, sua manifestação
é o esgotamento e o desaparecimento de toda ilusão e sua característica é a
liberação do sofrimento.
‐
Quem está iludido no samsara?
‐
Os seres sencientes das três esferas da existência.
‐
Sobre que base a ilusão se desenvolve?
‐
Sobre a base da vacuidade.
‐
Qual é a causa da ilusão?
‐
A grande ignorância.
‐
Quais são as modalidades dessa ilusão?
‐
A ilusão toma a forma de seis reinos, os quais os seres experimentam como realidade
objetiva.
‐
O que seria um exemplo de ilusão?
‐
O sonho durante o sono.
‐
Desde quando existe a ilusão?
‐
Desde que existe um samsara sem começo.
‐
Que há de errado com essa ilusão?
‐
A ilusão é a experiência do sofrimento.
‐
Quando a ilusão se transformará em consciência última?
‐
Quando o despertar for atingido.
‐
Pode‐se
pensar que a ilusão se dissipará por ela mesma?
‐
Não, porque o samsara não tem fim.
Você pensa que as ilusões se pacificam por si
mesmas? Este samsara de natureza ilusória é reputado por ser ilimitado, ter a
dimensão de um grande sofrimento e longa duração e não se liberar por si mesmo.
Consequentemente, a partir de agora esforce‐se em obter o Insuperável Despertar.
Apresentação das seis partes da obra
O resumo diz:
O que exatamente é preciso para alcançar o
Despertar?
A resposta é dada no resumo seguinte: ʺPotencialidade,
suporte, condição, meios, resultado e atividade: os seis pontos conhecidos por
todas as pessoas inteligentes resumem insuperável Despertar.ʺ
Devemos, pois, conhecer:
I A potencialidade do insuperável Despertar.
II A pessoa que é o suporte de sua realização.
III A condição que o incita a realizá‐lo.
IV Os meios que o permitem.
V Os frutos desta realização.
VI A atividade que disto decorre.
Esses seis pontos serão expostos sucessivamente.
* * *
O resumo diz:
I A potencialidade do Despertar é a natureza de
Buda
II O suporte é a preciosa existência humana.
III A condição é o amigo virtuoso.
IV Os meios são as instruções dele.
V O fruto é o corpo perfeito do Buda.
VI A atividade se exerce espontaneamente para o bem
de
todos os seres.
Esta obra, em vinte e um capítulos, trata do
desenvolvimento desses seis pontos.
Parte I
Capítulo 1
Gampopa
O Precioso Ornamento da Liberação
Parte I
Capítulo 1
A causa primeira do Despertar : A natureza de Buda
Todos os seres podem alcançar o Despertar
insuperável, pois eles possuem a causa primeira:
A natureza de Buda. – Citação de textos
I Porque o Corpo absoluto, a vacuidade, impregna
todos os seres.
II Porque no real, a assindade não tem distinções.
III Porque todos os seres têm o potencial do
despertar.
1] O potencial interrompido
1_Eles estão apegados ao samsara
2_Não têm fé
3_Não têm consideração pelos outros
4_Não têm vergonha de si mesmos
5_Não têm compaixão
6_Abandonam‐se aos atos negativos
2] O potencial incerto
Entrando na familia do mestre ou dos textos que
eles seguem
3] O potencial dos ouvintes
1_Temem o samsara
2_Crêem no nirvana
3_Não se alegram ao fazer o bem aos outros
4] O potencial dos Budas‐para‐si
4_Além dos precedentes, eles têm um grande orgulho
5_Guardam segredo sobre seu mestre
6_Amam ficar na solidão
Características dos estados alcançados pelos
ouvintes e os Budas‐para‐si
5] O potencial do Grande Veículo
1) Dois aspectos desse potencial
a) Potencial inato
b) Potencial adquirido
2) Sua essência
3) Seus diferentes nomes
4) A razão de sua superioridade
5) Suas duas fases
a) O potencial não desperto
b) O potencial desperto
1_As condições desfavoráveis
2_As condições favoráveis
6) As marcas distintivas do Bodhisattva
De acordo com a sua categoria, os seres estão mais
ou menos próximos do despertar
Comparações da presença do potencial de Buda: _A
prata _O óleo _A manteiga
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Gampopa
O Precioso Ornamento da Liberação
Parte I
Capítulo 1
A causa primeira do Despertar: A Natureza de Buda
Lemos nos textos que:
ʺA causa primeira é a natureza de Buda”.
Portanto, é necessário libertar‐se do samsara ilusório
e atingir o Despertar insuperável. Mas, perguntaremos, como nós, mpregando todos os esforços possíveis,poderiam
alcançá‐lo?
Atingiríamos o Despertar se nos
esforçássemos com fervor, já que todos os seres senscientes, dos quais fazemos
parte, possuem a natureza de Buda, que é a própria causa da budeidade.
O Sutra da absorção soberana afirma:
ʺA natureza de Buda está presente em
todos os seres.ʺ
E o Pequeno Sutra do nirvana:
ʺTodos os seres possuem a natureza de
Buda.ʺ
O Grande Sutra do nirvana diz ainda:
ʺAssim como a manteiga está presente no
leite,
A natureza de Buda está em todos os seres.ʺ
E o Ornamento dos sutras:
ʺTodos os seres tem a mesma natureza de
Buda,
Aquele que a tem purificada se chama Buda.ʺ
Por quais razões os seres possuem a natureza de
Buda?
1] Porque o corpo absoluto, a vacuidade, está em
todos os seres;
2] Porque na realidade, a natureza de Buda, não tem
distinções;
3] Porque todos os seres têm o potencial do
Despertar.
Por essas três razões, os seres têm a natureza de
Buda.
Citemos ainda o Continuum insuperável:
ʺPorque o corpo do perfeito Despertar
brilha,
Porque a natureza de Buda é indiferenciada,
E porque todos os seres têm o potencial de Buda,
Os seres possuem a natureza de Buda.ʺ
1] Quando dizemos que o corpo absoluto, a
vacuidade, está em todos os seres,
queremos dizer que o Buda é o corpo absoluto, que o
corpo absoluto é vacuidade, e que a vacuidade está em todos os seres. Por
conseqüência, os seres têm a natureza de
Buda.
2] Quando dizemos que, na realidade, a natureza de
Buda é indiferenciada, queremos dizer que, entre a natureza de Buda dos Budas e
a natureza de Buda dos seres ordinários, não há distinções entre bom e mau,
grande ou pequeno, alto e baixo,
conseqüentemente, todos os seres têm a natureza de
Buda.
3] Todos os seres têm o potencial do Despertar e
pertencem a cinco famílias.
E diferem entre si de acordo com seus potenciais:
1) O potencial interrompido,
2) O potencial incerto,
3) O potencial dos ouvintes,
4) O potencial dos Budas‐para‐si,
5) O potencial do Grande Veículo.
Essas cinco famílias representam todos os
potenciais do Despertar.
1) Os seres que possuem o potencial interrompido
têm, segundo o grande
Mestre Asanga, seis características:
1_não tem consideração pelos outros,
2_ignoram o sentimento de vergonha de si mesmos,
3_não têm compaixão, etc.
Mas vejamos como Asanga os descreve:
1_Eles percebem os defeitos do samsara, mas não
experimentam o menor desaapego;
2_Eles ouvem falar das qualidades dos Budas, mas
não sentem a menor fé;
3_Eles ignoram: o consideração com relação aos
outros,
4_a vergonha de si mesmos,
5_a compaixão;
6_Eles se entregam sem reservas aos atos negativos,
mas não sentem o menor arrependimento.
A budeidade não é atributo daqueles que estão
separados da causa.
No Ornamento dos sutras, Asanga diz ainda:
ʺAlguns agem unicamente para prejudicar,
Outros destróem tudo o que é bom,
Outros ainda não têm nenhum dos méritos necessários
à liberação:
Aqueles a quem faltam as virtudes, falta‐lhes a causa.ʺ
Dizendo que aqueles que possuem essas
características têm um “potencial interrompido”, queremos dizer que
permanecerão durante muito tempo no samsara, mas não que nunca atingirão o
Despertar. Esforçando‐se
com diligência, poderão também se tornar Budas.
Como o afirma o Sutra do lótus branco da compaixão:
ʺSuponha, Ananda, que um ser que não
está destinado a ultrapassar o sofrimento pense no Buda e lance‐lhe uma simples flor
no céu. E, então, este ser terá adquirido a possibilidade de atingir o fruto do
nirvana. A seu respeito, eu digo que ele caminha em direção ao nirvana e
acabará atingindo‐o.ʺ
2) Os seres cujo potencial é incerto são
dependentes das circunstâncias.
Seguindo, por exemplo, um amigo de bem,
freqüentando ouvintes ou lendo seus
sutras, começam a acreditar em sua doutrina,
entram, assim, em sua família e atingem
o nível de um ouvinte.
Se as circunstâncias os conduzirem em direção à via
dos Budas‐para‐si ou em
direção à via do Grande Veículo, eles seguirão
estas duas outras vias.
3) Os seres que têm um potencial de ouvinte temem o
samsara, crêem no
nirvana e só têm um pouco de compaixão.
1_Eles temem os sofrimentos do samsara,
2_Eles acreditam firmemente no nirvana,
3_E não se regozijam no bem dos seres;
Eis as três características do potencial dos
ouvintes.
4) Aqueles que têm um potencial de Buda‐para‐si possuem as três
características precedentes, mas, além disso, eles
são muito seguros de si mesmos,
mantem secreta a identidade de seu mestre e gostam
de permanecer sós em lugares
desertos.
Cansados do samsara, eles gostam do Nirvana,
Fraca é sua compaixão, enorme seu orgulho,
Seu mestre é um segredo, eles gostam de permanecer
sós:
Neles, o sábio reconhece o potencial dos Budas‐por‐si.
Mesmo quando os seres da família dos ouvintes e dos
Budas‐para‐si estão
engajados em sua respectiva via e atingem o seu
fruto, esse fruto não é o verdadeiro
nirvana. Então, em que situação se encontram? Ainda
estão marcados por uma
propensão à ignorância e possuem um corpo mental
adquirido pelo poder de atos não
contaminados. Eles se encontram em estado de
concentração profunda, igualmente
não contaminada, e, tomando esse estado por
nirvana, ali permanecem.
Mas, podemos pensar que, por não se tratar do
verdadeiro nirvana, não seria
lógico que o Buda tivesse ensinado essas duas vias.
Mas, de fato, é lógico. Tomemos a
imagem destes comerciantes que partiram para o
oceano em busca de pedras preciosas.
Durante a viagem, chegam a uma vasta terra árida
onde se exaurem e perdem a
coragem. Pensam, então, que nunca encontrarão o que
procuram e apressam‐se
em
reencontrar seu caminho, quando seu capitão indica
milagrosamente uma grande
cidade e os convidam a descansarem ali para retomar
as forças. O mesmo ocorre com
aqueles que não têm coragem. Quando escutam falar
da sabedoria dos Budas, o medo
se lhes apodera e dizem que deve ser muito
cansativo atingir a budeidade, que não
serão capazes. Eles não se engajam na via ou, se o
fazem, acabam retrocedendo. O
Buda lhes mostra então, a via dos ouvintes e aquela
dos Budas‐para‐si, e orienta‐lhes a
repousar nos dois níveis de Despertar nos quais
essas vias chegam.
Lemos no Lótus branco do sublime Dharma:
ʺÉ assim que todos os ouvintes
Pensam ter atingido o nirvana,
Mas o Buda lhes diz:
Este não é o nirvana, é um lugar de repouso.ʺ
Uma vez que tenham descansado no nível dos ouvintes
e dos Budas‐para‐si, o
Tathagata, que tem conhecimento disso, exorta‐os a atingir a
budeidade.
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Como ele procede? Com seu corpo, sua palavra e sua
mente. De seu coração,
emite raios de luz, que pelo simples contato com o
corpo mental desses seres,
despertam‐lhes de sua concentração contaminada.
Depois, mostrando‐lhes
a aparência
de seu corpo, e, de sua palavra, ele os exorta
nestes termos:
ʺMonges, o que vocês fizeram não basta,
vocês não realizaram sua
tarefa; seu nirvana não é o verdadeiro nirvana.
Agora, ó monges,
aproximem‐se do Tathatagata! Escutem‐no! Realizem!ʺ
Encontramos a mesma exortação em forma de versos no
Lótus branco do sublime
Dharma:
ʺTambém, monges, hoje eu declaro:
Que este ainda não é o nirvana.
Para atingir a onisciente sabedoria,
Armem‐se todos de uma forte coragem
E essa sabedoria será de vocês.ʺ
Com essas palavras, os ouvintes e os Budas‐para‐si produzem pela
primeira vez
a mente do grande Despertar. Depois, após terem
agido como Bodhisattvas durante
um número incalculável de kalpas, eles atingem a
budeidade. O que aparece também
no Sutra da entrada em Lanka.
O Lótus branco do sublime Dharma diz ainda:
ʺEstes ouvintes não atingiram o nirvana,
Mas todos tornar‐se‐ão Budas
Quando tiverem praticado a conduta dos
Bodhisattvas.ʺ
5) Vejamos agora o que caracteriza o potencial do
Grande Veículo:
1_As duas categorias do potencial do Grande Veículo
2_A essência desse potencial
3_Seus diferentes nomes
4_As razões de sua superioridade
5_Seus dois aspectos
6_Suas marcas distintivas
1_Os dois aspectos do potencial do Grande Veículo:
Distinguem‐se:
a) o potencial inato e
b) o potencial adquirido.
a) O potencial inato é a capacidade, que possuímos
desde sempre, de fazer
nascer todas as qualidades dos Budas. Somos
naturalmente dotados desse potencial.
b) O potencial adquirido é a capacidade de tornar‐se Buda, que é
adquirida
cultivando as fontes de bem.
2_A essência desse potencial:
Esses dois potenciais permitem atingir a budeidade.
3_Seus diferentes nomes
Chamamos às vezes esse potencial de “grão”,
“elemento” ou “natureza”.
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4_As razões de sua superioridade
O potencial da família do Grande Veículo é
eminentemente superior ao das
demais. Aquele dos ouvintes e dos Budas‐para‐si são chamados
“inferiores”, pois, para
realizá‐los plenamente, basta que suprimam o
véu emocional.
O potencial do Grande Veículo é supremo, pois ele
atinge sua perfeição quando
os dois véus se dissipam. Por essa razão, ele
supera o potencial dos outros veículos.
5_Seus dois aspectos
Esse potencial pode ser:
a) desperto ou
b) não desperto.
a) Ele é desperto quando “seu fruto é perfeitamente
atingido”. Seus sinais são,
então, visíveis.
b) Ele não é desperto enquanto “seu fruto não foi
perfeitamente atingido”. Seus
sinais, então, não aparecem.
O que provoca o despertar desse potencial? Seu
despertar é produzido quando
as condições desfavoráveis estão ausentes e as
condições favoráveis, presentes. No
caso contrário, o potencial permanece adormecido.
1‐As
condições desfavoráveis são quatro: 1: renascer num estado sem as
liberdades, 2: não ter as propensões necessárias,
3: dedicar‐se
à atividades negativas e
4 : ter uma mente obscurecida.
2‐As
condições favoráveis são duas: 1‐ A primeira depende do outro: é
o fato de receber o ensinamento do Dharma. 2‐ A segunda depende de
si: é uma
atitude mental adequada que consiste, entre outras,
em aspirar ao bem.
6_Os sinais distintivos do potencial do Grande
Veículo são aqueles que indicam
a participação na família dos Bodhisattvas.
Lemos no Sutra dos dez Dharmas:
ʺO potencial dos Bodhisattvas para a
mente superior
Reconhece‐se por seus sinais,
Como o fogo pela fumaça
E a presença da água, pelos patos.ʺ
Quais são os sinais que caracterizam o Bodhisattva?
Sem ter aplicado o
remédio, no corpo e na palavra, ele é naturalmente
suave; sua mente não conhece a
hipocrisia; e finalmente, ele é bom com os outros
seres e tem fé.
Ainda no Sutra dos dez Dharmas:
ʺNem violento nem colérico,
E despido de hipocrisia,
Ele ama todos os seres:
Tal é o Bodhisattva.ʺ
Além disso, a compaixão pelos seres está em cada um
de seus atos, ele tem fé no
ensinamento do Grande Veículo, aceita pacientemente
as tarefas difíceis e pratica de
maneira autêntica as fontes de bem que provêm das
seis virtudes transcendentes.
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Lemos no Ornamento dos sutras:
ʺCompadecer‐se antes de agir,
Ter fé, ser paciente,
E praticar o bem, de forma autêntica:
Tais são as marcas desse potencial.ʺ
Dentre os cinco potenciais de Buda, aquele dos
Bodhisattvas permite atingir a
budeidade em curto prazo. Chamam‐no de “causa próxima”.
O potencial dos ouvintes e o dos Budas‐para‐si permitem atingir a
budeidade
em longo prazo; chamam‐nos “causas
distantes”.
Quanto ao potencial incerto, ele é às vezes causa
próxima e às vezes causa
distante.
O termo “potencial interrompido” nos remete
simplesmente a uma idéia de
duração; não significa que a budeidade seja
impossível, mas constitui uma “causa
extremamente distante”.
De onde se deduz que, já que os seres pertencem a
uma ou outra dessas
famílias, eles possuem a natureza de Buda, e que,
pelas três razões citadas acima, essa
verdade aplica‐se a todos.
À que podemos comparar o potencial de Buda? À prata
que se encontra no
mineral, ao óleo no grão de sésamo ou a manteiga no
leite. De fato, do ser ordinário, é
possível fazer um Buda.
35
gJ/,
Parte II
Capítulo 2
36
37
Gampopa
O Precioso Ornamento da Liberação
Parte II : Capítulo 2
O suporte da Iluminação ‐ A preciosa existência
humana
I Concernem ao corpo: As 8 Liberdades e as 10
Aquisições
A] As 8 Liberdades:
‐Quatro
correspondem aos não‐humanos:
1) Não ter nascido nos infernos
2) Não ter nascido como espírito ávido
3) Não ter nascido como animal
4) Não ser um deus de longa vida
‐Descrição
das dificuldades específicas da cada condição de existência
‐As
vantagens dos pequenos sofrimentos humanos:
a) Eles nos desviam do Samsara b) Diminuem nosso
orgulho
c) Fazem desenvolver a compaixão d) Fazem evitar os
atos nocivos e praticar a virtude.
‐
Quatro correspondem ao nascimento humano:
5) Não ter nascido entre os homens ignorantes e
bárbaros
6) Não ter visões errôneas
7) Não ter nascido em um período sem Buda
8) Ser desprovido da faculdade da compreensão
B] As 10 Aquisições
‐Cinco
por si mesmo:
1) Nascer humano
2) Nascer em um país central
3) Ter todas as faculdades
4) Não ter uma karma contrário (cometido os atos de
retribuição imediata)
5) Ter fé no objeto justo (confiança no Dharma)
‐Cinco
pelos outros:
6) A vinda de um Buda ao mundo
7) Que ele tenha ensinado o Dharma
8) Que os Ensinamentos ainda perdurem
9) Que haja pessoas que o pratiquem
10) Que existam pessoas que tenham uma atitude
benevolente.
A preciosa existência humana reúne as 8 liberdades
e as 10 aquisições.
§ Ela é dita ʺPreciosaʺ porque, tal como a Jóia dos
Desejos, ela é:
1] Difícil de obter: (Citação de quatro textos)
a) Um exemplo: A tartaruga marinha
b) Para quem ela é ainda mais difícil de obter: Os
seres dos três mundos inferiores.
c) Por que ela é difícil de obter: Resulta da
prática da virtude.
2] De um grande benefício: Ela permite realizar o
objetivo dos seres qualificados:
Três níveis de qualificações/motivação:
a) Não cair nos estados inferiores e obter
novamente um estado humano ou divino.
b) Se liberar do Samsara
c) Obter o estado de Buda para o benefício de todos
os seres.
Ela é superior aos estados divinos e mais preciosa
do que a jóia que realiza desejos.
§ Obtida a uma grande pena e de um grande
benefício: Ela é facilmente destruída
a) Nada regenera seu princípio vital
b) Os fatores de morte são numerosos
c) Ela se esgota momento a momento
§ É por isso que: É necessário considerar o corpo
como: ‐Um
bote ‐Uma
montaria ‐Um
servidor
(seguem os 3 tipos de fé)
38
39
Gampopa
O Precioso Ornamento da Liberação
Parte II : Capítulo 2
O suporte da Iluminação ‐ A preciosa existência
humana
II Concernem à mente: Os 3 tipos de fé
_A importância da fé (citação de 3 sutras)
A ] Classificação: _Existem 3 tipos de Fé
1 ] A Fé da confiança :
Ela se funda e se desenvolve sobre a compreensão do
Dharma.
2] A Fé da aspiração:
Fundada sobre uma visão da insuperável Iluminação,
ela desenvolve
uma motivação para obtê‐la através do percurso
da Via do Dharma.
3] A Fé vasta:
É uma confiança lúcida que se desenvolve com
referência nas Três Jóias.
‐Citação
de um texto para confirmar o que foi exposto.
B ] Outra Definição: ʺ Aquele que têm Fé não abandona o
Dharmaʺ:
a) Por desejo
b) Por cólera
c) Por medo
d) Por ignorância
Dedução / definição: Aquele cuja fé tem essas
quatro características é um receptáculo excelente
para a realização do supremo atingimento.
C ] Os Benefícios desses diferentes tipos de Fé são
imensos:
_Eles fazem desenvolver as qualidades da mente dos
seres qualificados superiores.
_Permitem abandonar os estados sem liberdade.
_Tornam nossas faculdades vivas e claras.
_Protegem nossa disciplina.
_Dissipam as paixões.
_Nos livram dos ataques de demônios.
_Fazem descobrir a via da liberação.
_Fazem desenvolver imensas virtudes.
_Fazem ver e obter as bençãos de numerosos Budas.
_Delas surgem inúmeros benefícios.
‐Exposição
sustentada pela citação de dois textos.
‐Fórmula
resumindo a definição do precioso corpo humano:
Então, o que se chama ʺA preciosa existência
humanaʺ
é aquela cujo corpo é provido dos dois
aspectos, que são as Liberdades e as Aquisições, e
cuja mente é provida dos três tipos de Fé. Esta é a
pessoa que é o suporte para realizar a insuperável
Iluminação.
40
41
Gampopa
O Precioso Ornamento da Liberação
Parte II
Capítulo 2
O suporte do Despertar: A Preciosa Existência Humana
ʺO suporte é a preciosa e suprema
existência humana”.
Considerando que todos os seres possuem a natureza
de Buda, podemos nos
perguntar se aqueles que pertencem às cinco outras
formas de existência não humana –
os condenados aos infernos, os pretas, etc. – têm a
capacidade de tornarem‐se
Budas.
Não, eles não têm. O “suporte” que permite a
realização da budeidade é o que
chamamos uma “preciosa existência humana”, ou seja,
uma existência provida das oito
liberdades e das dez aquisições, assim como uma
mente que possua os três tipos de fé.
É desta preciosa existência humana que trataremos
agora. Nosso estudo será sobre
cinco temas: dois relacionados ao corpo e três
relacionados à mente:
1] As 8 liberdades
2] As 10 aquisições
3] A fé da convicção
4] A fé da aspiração
5] A fé vasta
* * *
1] As 8 Liberdades:
Ser “livre” é estar livre das oito servidões que o
Sutra da Fixação da Atenção
descreve da seguinte maneira:
ʺTer nascido nos infernos, preta,
animal,
Bárbaro, deus de longa vida,
Em uma era sem Buda, tomado por falsas idéias,
Ou idiota: eis as oito servidões.ʺ
De que modo estes oito estados são servidões? Os
seres dos infernos sofrem
sem interrupção, os pretas têm a mente atormentada
e os animais têm como marca
maior uma extrema estupidez. Além disso, como os
seres desses três mundos não
sentem nenhuma vergonha nem consideração, seu
continuum psíquico é impróprio ao
bem. Portanto, não têm oportunidade de praticar o
Dharma.
Quanto aos deuses de longa vida, não mais possuem
percepções. O continuum
de sua consciência e todas as suas produções
mentais, estando interrompidas, não têm
nenhuma oportunidade de praticar o Dharma. O termo
“deuses de longa vida” pode
também designar os deuses do mundo do Desejo,
porque, em comparação aos homens,
esses deuses vivem um tempo muito longo.
42
Podemos igualmente considerar que todos os deuses
são em seu conjunto
privados de liberdade: são tão apegados à sua
felicidade temporária que não têm a
possibilidade de se dedicarem ao bem verdadeiro.
Vemos, então, que os pequenos
sofrimentos humanos que nos afetam no momento não
deixam de ter certas utilidades.
Eles nos fazem ficar cansados do samsara, pacificam
nosso orgulho, fazem com que
sejamos compassivos com os outros, atenuam os atos
negativos e fazem‐nos
apreciar o
bem.
Como o diz a Marcha em Direção ao Despertar:
ʺAlém disso, os sofrimentos têm por
virtude
Cansar‐nos, expulsar nosso orgulho,
Fazer‐nos ter compaixão pelos outros seres do
samsara,
Preservar‐nos dos maus atos e fazer‐nos amar o bem.ʺ
Assim, falamos de quatro mundos de existência
privados de liberdade.
Ademais, entre os seres humanos, são privados de
liberdade aqueles que chamamos de
“bárbaros”, porque têm poucas chances de encontrar seres
sublimes; aqueles que
mantêm crenças errôneas, porque não vêem no bem a
causa dos mundos superiores e
da liberação; aqueles que nasceram em um mundo sem
Buda, porque não têm
ninguém para ensinar‐lhes o que convém praticar e o que
não se deve fazer; os idiotas,
porque são incapazes de compreender por si mesmos
os ensinamentos que mostram
onde está o bem e onde está o mal.
Não estar sujeito a nenhuma dessas oito servidões
constitui o que chamamos as
“liberdades perfeitas”.
2] As 10 Aquisições
Distinguimos: 1) Cinco aquisições que dependem de
si
2) Cinco aquisições que dependem do outro.
1) As cinco aquisições que dependem de si :
1) Ser um humano,
2) Ter nascido num país central,
3) Ter todas as suas faculdades,
4) Não ter karma contrário,
5) Ter fé no objeto justo.
1) Ser “humano” é compartilhar a condição de todos
os seres humanos, homens
e mulheres.
2) Ter “nascido num país central” é ter nascido em
um lugar onde há a
possibilidade de seguir seres sublimes.
3) Possuir “todas as suas faculdades” é não ter
deficiências de nenhum dos seis
sentidos, portanto, poder praticar o virtuoso
Dharma.
4) Não ter um “karma contrário” é não ter cometido
nesta vida um dos atos de
retribuição imediata.
5) Ter “fé no objeto justo” é ter fé em todos os
virtuposos Ensinamentos,
disciplina e o snnto Dharma ensinado pelo Buda.
43
2) As cinco aquisições que dependem do outro:
1) A vinda de um Buda ao mundo,
2) Que ele tenha ensinado o Dharma,
3) Que esse Dharma ainda exista,
4) Que ele seja praticado,
5) Que existam seres plenos de amor pelos outros.
Gozar das dez aquisições que dependem de si e dos
outros é o que chamamos
“possuir as aquisições perfeitas”.
A preciosa existência humana é a que reune esssas
liberdades e aquisições.
Por que “preciosa”?
Porque: 1) é difícil de ser obtida e
2) é de uma grande utilidade, ela é comparável à
preciosa jóia
mágica.
1) No que se refere à dificuldade de ser obtida,
lemos no Pitaka dos Bodhisattvas:
ʺÉ difícil tornar‐se um ser humano;
É igualmente difícil obter uma simples vida humana;
É difícil receber o Dharma,
E é igualmente difícil que apareça um Buda.ʺ
E ainda, no Sutra do Lótus Branco da Compaixão:
ʺDifícil é o nascimento humano, difíceis
de serem obtidas as liberdades
perfeitas,
Difícil a vinda de um Buda ao mundo,
Difícil a aspiração ao bem e difíceis de serem
obtidas as orações puras.ʺ
No sublime Sutra em Forma de Árvore:
ʺÉ difícil escapar às oito servidões,
difícil renascer como homem, difícil
gozar das oito verdadeiras liberdades perfeitas,
difícil que um Buda
apareça, difícil possuir todas as faculdades,
difícil escutar o ensinamento
de um Buda, difícil encontrar‐se em companhia de
seres sublimes, difícil
encontrar mestres espirituais autênticos, difícil
praticar o caminho de
maneira autêntica e conforme aos ensinamentos,
difícil viver de maneira
correta, e difícil, neste mundo humano, praticar
conscienciosamente o
que é conforme ao Dharma.ʺ
A Marcha em Direção ao Despertar diz também:
ʺEstas liberdades e estas aquisições são
extremamente difíceis de sem
obtidas.ʺ
Qual imagem poderia ilustrar a dificuldade de obter
tal existência humana?
Para que tipo de ser há esta dificuldade de
encontrar?
E que tipo de dificuldade é esta?
Daí os exemplos:
A Marcha em Direção ao Despertar responde:
ʺAssim, diz o Buda, é tão difícil tornar‐se um homem quanto uma
tartaruga passar sua cabeça por uma argola que
esteja boiando nas
ondas do imenso oceano.ʺ
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Qual é a origem desta comparação? Ela está no
próprio Buda:
ʺSuponha que esta terra se transforme
totalmente em água e que uma
argola seja jogada nela e bóie ao sabor dos ventos
em todas as direções.
Imagine ainda que uma tartaruga cega, que tenha
vivido milhares de
anos, suba a superfície uma vez a cada cem anos.
Apesar de ser muito
difícil que essa tartaruga consiga passar sua cabeça
pela argola, ainda
assim, isso é possível. Ter uma preciosa existência
humana é ainda mais
difícil do que isso.ʺ
Para quem esta existência humana é tão difícil de
ser obtida? Para os seres dos
três mundos inferiores?
Por que uma existência dotada das liberdades e das
aquisições é difícil de ser
obtida? Porque resulta da acumulação de atos
virtuosos. Quando se nasce nos três
mundos inferiores, sem saber como praticar a
virtude, passa todo o tempo somente
acumulando atos negativos. Em conseqüência, para
obter uma preciosa existência
humana após ter renascido nos mundo inferiores, é
preciso ter um karma em que a
parte dos atos negativos não seja dominante e dê
seus frutos mais tarde, ao longo de
outras vidas.
2) Uma existência humana rica e livre é de grande
benefício.
Diz a Marcha em Direção ao Despertar:
ʺEla permite ao ser humano atingir seu
objetivo.ʺ
“Ser humano” é a tradução do sânscrito purusha, que
traduz uma idéia de
força, de capacidade. Emprega‐se esse termo porque
uma existência livre e rica dá
força, ou oferece a capacidade, de alcançar as
formas de vida superiores, bem como o
bem último.
Na medida em que essa capacidade seja grande, média
ou fraca, distinguimos
três tipos de seres humanos.
A Tocha do Caminho do Despertar declara:
ʺSaiba que existem três gêneros de
homens:
Os medíocres, os médios e os superiores.ʺ
Os seres humanos medíocres têm a capacidade de não
cair nos mundos
inferiores e de atingir a condição de homem ou de
deus.
ʺO ser humano que, da maneira que for,
Procura, para seu bem pessoal,
A simples felicidade do samsara,
É qualificado de medíocre.ʺ
Os seres humanos médios têm a capacidade de liberar
a si mesmo do samsara e
de obter, assim, um estado de felicidade e de paz.
ʺO ser humano que, dando as costas à felicidade
do vir‐a‐ser,
E guardando‐se dos atos negativos,
Busca a paz apenas para si mesmo,
É qualificado de médio.ʺ
Os seres humanos superiores têm a capacidade de
tornar‐se
Buda para bem de
todos os seres.
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ʺAlguém que, sentindo seu próprio
sofrimento,
Deseje intensamente pôr fim
A todos os sofrimentos dos outros,
É o melhor dos seres humanos.ʺ
Para mostrar até que ponto a preciosa existência
humana é benéfica, mestre
Chandragomin declara:
ʺQuando um ser humano, tendo obtido a
existência humana, semeia
méritos,
Esses grãos da liberação do oceano dos
renascimentos e do Despertar
supremo,
Suas virtudes ultrapassam de longe às da jóia
mágica.
Quem pode destruir o fruto que ele colherá?
O caminho tomado pelo homem de grande coragem
Não está ao alcance dos deuses, dos nagas, dos
semideuses,
Dos garudas, dos vidyadharas, dos kinnaras, nem dos
uragas.ʺ
Uma existência humana dotada das liberdades e das
riquezas permite renunciar
ao mal, fazer o bem, atravessar o oceano do
samsara, progredir em direção ao
Despertar e atingir a budeidade perfeita. Ela é,
portanto, muito superior à existência
dos deuses, dos nagas, e assim por diante. Ela é
mesmo superior à preciosa jóia mágica.
Como é difícil de ser obtida e proporciona grandes
benefícios, é qualificada de
“preciosa”.
Todavia, embora difícil de ser obtida e benéfica,
essa existência é extremamente
facilmente destruída já que ninguém pode prolongar
a duração de sua vida nem
restaurar seu princípio vital, as causas de morte
são inúmeras e a vida não é estável
nem num único instante.
Lemos na Marcha em Direção ao Despertar:
ʺÉ ingenuidade ficar feliz em pensar,
Que não morreremos hoje,
Pois é certo que esse momento chegará.
Isto é certoʺ
Visto que esta existência é ao mesmo tempo tão
útil, tão difícil de ser
encontrada e tão fácil de ser destruída,
consideremo‐la
como um navio no qual iremos
atravessar o oceano do samsara.
ʺSobre o navio da existência humana,
Pode‐se atravessar o grande rio do
sofrimento.
Como vocês terão dificuldades em encontrá‐lo,
Ignorantes que são, quando ele se apresentar, não
durmam!ʺ
Ou ainda, consideremos esse corpo humano como um
animal de sela e fujamos
o mais rápido possível do perigoso caminho dos
sofrimentos do samsara.
ʺSobre o cavalo de uma existência humana
pura,
Escapem do desfiladeiro do samsara.ʺ
Ou, ainda, pensemos que nosso corpo é um servo e
empreguemo‐lo
na prática
do bem.
ʺEste nosso corpo humano
É bom para servir.ʺ
46
Os 3 tipos de Fé
Entretanto, para seguir estes conselhos, é
necessário ter fé. Sem fé, diz‐se,
nada
pode acontecer de positivo no continuum da mente. O
Sutra dos Dez Dharmas esclarece:
ʺOs homens sem fé
Não desenvolvem boas qualidades,
Assim como uma semente queimada
Não germina.ʺ
E o Sutra de Avatamsaka:
ʺOs seres deste mundo que não têm fé
Não podem conhecer o Despertar do Buda.ʺ
Portanto, tenham fé, como a Imensa Manifestação
recomenda:
O Buda declarou: ʺ Aplique‐se na fé, Ananda! É a
súplica que o
Tathagata lhe dirige”.
Como descrever a fé? Distinguimos três formas de
fé:
1) a fé da confiança
2) a fé da aspiração
3) a fé vasta.
3] A Fé da confiança
Esse tipo de fé se desenvolve sobre o suporte: o
tema dos atos e seus frutos, a
verdade do sofrimento e a verdade da origem do
sofrimento. É a certeza de que os atos
positivos geram a felicidade no mundo do desejo,
que os atos negativos resultam em
sofrimentos neste mesmo mundo, que os atos
imutáveis produzem a felicidade nos
dois mundos superiores, e que os atos e as paixõe
s(que constituem a origem do
sofrimento) geram os cinco agregados contaminados
do sofrimento.
4] A Fé da aspiração
É a fé daquele que, tendo constatado o caráter
eminentemente precioso do
Despertar insuperável, deseja percorrer com
respeito o caminho para obter o
Despertar.
5] A Fé vasta
Esse tipo de fé tem como objeto as Três Jóias. É um
sentimento de interesse, de
respeito e de alegria com relação ao Buda que
ensina o caminho, do Dharma que é o
caminho, e a Sangha constituída pelos companheiros
na prática do caminho.
Lemos no Abhidharma:
ʺO que é a fé? A fé é uma confiança, um
desejo e uma alegria intensa no
pensamento do karma, de seus frutos, da verdade e
das Três Jóias.ʺ
E na Guirlanda de Jóias:
ʺAquele que não renuncia ao Dharma
Por desejo, por cólera, por medo,
Ou por ignorância, diz‐se que tem fé.
Ele é, seguramente, o melhor dos recipientes.ʺ
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Não renunciar ao Dharma por desejo é não abandoná‐lo, mesmo quando nos é
oferecido em contrapartida alimento, dinheiro,
mulheres, reinos ou qualquer outro
presente suntuoso.
Não deixar o Dharma por cólera é não abandoná‐lo por causa de um ser
que já
nos tenha prejudicado e que nos faça novamente
muito mal, da maneira que for.
Não renunciar ao Dharma por medo é não abandoná‐lo mesmo sob a ameaça
de
todos os dias termos cinco onças1 de nossa própria
carne cortada por cada um de
trezentos guerreiros.
Não renunciar ao Dharma por ignorância é não
abandoná‐lo,
mesmo quando
nos dizem que o karma, o fruto dos atos, as Três
Jóias, tudo isso é falso, que é inútil
praticar o Dharma, e que é melhor renunciá‐lo.
Quem se comporta desse modo nessas quatro situações
tem fé e constitui um
excelente recipiente para realizar o bem último.
As três formas de fé advêm de incomensuráveis
virtudes: elas permitem gerar a
atitude mental dos seres sublimes, emancipar‐se dos estados de
existência onde não se
goza de nenhuma liberdade, possuir as faculdades
sensoriais e mentais aguçadas e
claras, evitar as infrações à disciplina, colocar
um fim nas emoções negativas,
preservar‐se das forças malevolentes, encontrar o
caminho da liberação, acumular
imensos méritos, encontrar inúmeros Budas, ser
abençoado por eles, e muitas outras
coisas ainda. Os benefícios produzidos por esses
três tipos de fé são propriamente
inconcebíveis.
Lemos na Tocha das Três Jóias:
ʺA fé nos Vencedores e no seu Dharma,
A fé na atividade dos Bodhisattvas
E no insuperável Despertar,
É a atitude mental dos grandes seres.ʺ
Além disso, os Budas aparecem e ensinam àqueles que
têm fé, como afirma o
Pitaka dos Bodhisattvas:
ʺQuando os bodhisattvas têm fé, os Budas
sabem que eles são dignos
recipientes para o ensinamento; eles lhes aparecem
e lhes mostram
perfeitamente o caminho dos bodhisattvas.ʺ
Assim, o ser dotado da preciosa existência humana,
isto é, dotado de um corpo
que possui as liberdades e as riquezas e uma mente
que possui os três tipos de fé,
constitui o “suporte” favorável para a realização
do Despertar insuperável.
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