quarta-feira, 7 de abril de 2010

AS QUATRO NOBRES VERDADES




AS QUATRO NOBRES VERDADES





Isto foi ouvido por mim: Naquele tempo o Senhor permanecia em Baranasi, Isipatana, no Par-que das Gazelas. Então, na verdade, o Senhor se dirigiu aos monges constituídos num grupo de cinco: “ó monges, há dois extremos que não devem ser freqüentados por um recluso; há o apego ao divertimento mundano com referência ao prazer sensual, baixo, comum, pertencente ao homem inferior, ignóbil, associado à miséria; há o apego a auto-mortificação, (cheio de) sofrimento, ignóbil, associado à miséria. Ó monges, sem chegar a estes dois extremos, o caminho médio foi realizado pelo Caminhante produzindo despertar, produzindo Conhecimento, levando à Serenidade, especial conhecimento, correta iluminação, Nibbana.

E, ó monges, qual é aquele caminho médio que foi realizado pelo Caminhante, produzindo despertar, produzindo conhecimento, levando a serenidade, especial conhecimento, Nibbana? Este não é nenhum outro senão o Nobre Óctuplo Caminho, a saber: correta visão, correta intenção, correta palavra, correta ocupação, correta modo de vida, correto esforço, correta atenção, correta concentração. Este, ó monges, é o médio caminho realizado pelo Caminhante, produzindo despertar, produzindo conhecimento, levando à serenidade, especial conhecimento, correta iluminação, Nibbana.
Ó montes, o Perfeito estabeleceu em Isipatana, no Parque das Gazelas, perto de Benares, o reino supremo da Verdade, que ninguém poderá mudar, seja um asceta, um sacerdote, uma entidade invisível, um deus, um demônio, ou alguma pessoa de qualquer parte do mundo.
Este supremo reino da verdade consiste na proclamação, na exposição, no fundamento, na manifestação, na revelação, na explicação e na demonstração dos Quatro Nobres Princípios.
Quais são esses Quatro Nobres Princípios? São o Nobre Princípio de dukkha, o Nobre Princípio das causas de dukkha, o Nobre Principio da extinção de dukkha, o Nobre Princípio do Caminho que conduz à extinção de dukkha.
E o Sublime disse: Ó monges!, enquanto meu conhecimento e minha penetração a respeito de cada um desses nobres princípios não estavam totalmente claros, eu duvidei se havia ou não adquirido a completa penetração deste conhecimento, que não tem igual no céu, nem sobre a terra, nem há outro mais excelente entre todas as assembléias dos ascetas e dos sacerdotes, nem entre os deuses, nem entre os homens.
Porém, ó monges, quando minha inteligência e minha penetração acerca desses quatro princípios foram perfeitamente claras, então nasceu em mim a certeza de que eu havia adquirido a completa posse deste conhecimento, que não há sido superado nem no céu, nem na terra, não havendo outro mais excelente entre todas as assembléia de ascetas ou de sacerdotes, nem entre os homens. E eu proclamei como real este excelso conhecimento; conhecimento difícil de penetrar, de compreender, tranqüilizador, que só pode ser conquistado pelo raciocínio e pela observação, que só pode ser conquistado pela compreensão, conhecimento que é profundo e que só é acessível ao Sábio.

O mundo, sem dúvida, ama o prazer, está apegado a ele e se deixa seduzir por ele. Porém em verdade aqueles que vão, impulsionados pelo desejo, após os prazeres, que estão apegados a eles, que se deixam seduzir por eles, dificilmente poderão compreender a lei da causalidade. A eles lhes será impossível compreender a extinção de todas as formas do eu, a liberação de todos os aspectos da existência, o aniquilamento dos desejos, o desapego do desejo e chegar ao final, ao Nibbana.
Porém entre os homens há alguns, cujos olhos apenas se estão velados pelo pó, e estes homens claramente poderão compreender o que é verdadeiro.


O CONTEÚDO DO PRIMEIRO PRINCÍPIO

E agora, ó monges, qual é o Primeiro Princípio? É o Nobre princípio de Dukkha.
O nascimento é sofrimento; a velhice é sofrimento; a enfermidade é sofrimento; a morte é sofrimento; o lamento, a pena, a desconfiança é sofrimento. E isto é chamado sofrimento comum.
Não poder obter o que se deseja é sofrimento; a união com quem não se ama é sofrimento; a separação daquele que se ama é sofrimento. E isto é chamado sofrimento da mudança.
Os cinco aspectos da existência é sofrimento, a saber: a matéria é sofrimento; as sensações são sofrimento; as percepções são sofrimento; as consciências são sofrimento; as volições são sofrimento. E isto é chamado sofrimento produzido pelos cinco aspectos da existência.
E agora, ó monges, que é o nascimento?
O nascimento, a gestação, a concepção, a procriação, a manifestação dos cinco aspectos da existência dos egos humanos, qualquer que seja a classe social a que pertençam, o despertar dos sentidos, isto, ó monges, é o que se chama nascimento.
E agora, ó monges, que é a velhice?
Adiantar-se em anos, tornar-se triste, decadente, decrépito e enrugado, qualquer que seja a classe social a que pertença, a perda da força vital, o debilitamento dos sentidos, isto, ó monges, é a velhice.
E agora, ó monges, que é a morte?
O passar além de, o desaparecimento dos egos, qualquer que seja a classe social a que pertença, a separação, a desintegração, o apagar, a dissolução, o fim da existência, o desaparecimento dos aspectos da existência, a putrefação do corpo, isto, ó monges, é a morte.
E agora, ó monges, que é a angústia?
Cada vez, ó monges, que alguém sofre qualquer desventura, desgosto, turbação, aflição, desânimo, decadência, isto, ó monges, é a angústia.
E agora, ó monges, que é a lamentação?
Cada vez, ó monges, que se experimenta uma perda, que se padece uma desventura, que há gemido, compadecimento e uma monótona queixa a isto se chama lamentação.
E agora, ó monges, que é a pena?
Cada vez, ó monges, que há algo doloroso ou desagradável para o corpo e isto é percebido mediante o contato corporal como penoso e desagradável, isto, ó monges, é chamado pena.
E agora, ó monges, a que se chama aflição?
Cada vez, ó monges, que há algo penoso e desagradável para a mente e isto é sentido pelo contato mental como penoso e desagradável, a isto, ó monges, se lhe chama aflição.
E agora, ó monges, a que se chama desespero?
Cada vez, ó monges, que se sofre uma perda, devida a uma ou outra ansiedade, há desencorajamento, desconfiança, abatimento, quedando sem esperança, a isto, ó monges, se chama desespero.
E agora, ó monges, que é a dor causada por não poder conseguir o que se deseja?
Os homens sujeitos ao nascimento, ó monges, têm este desejo, que não estivessem sujeito ao nascimento, que nenhum novo nascimento tivessem por adiante. Porém isto não se pode conseguir só desejando-o, e ao não poder obter o que se deseja sobrevém a dor. Aos homens, ó monges, sujeitos à velhice, à enfermidade, à morte, à angústia, à lamentação, à pena, à aflição e à desesperação lhes vem este desejo: Oh se não estivéssemos nós sujeitos à velhice, à enfermidade, à morte, à angústia, à lamentação, à pena, à aflição e ao desespero. Porém a impossibilidade de conseguir isto é dukkha.
Em resumo, ó monges, quais são os cinco aspectos da existência? Eles são a existência material, a sensação, a percepção, a volição e a consciência.
Cada existência material, ó monges, seja ela nossa ou alheia, seja ela grosseira ou refinada, grande ou pequena, distante ou próxima pertence ao aspecto da existência material.
Cada sensação, ó monges, seja ela nossa ou alheia, seja ela grosseira ou refinada, grande ou pequena, distante ou próxima, pertence ao aspecto da sensação.
Cada percepção, ó monges, seja ela nossa ou alheia, seja ela grosseira ou refinada, grande ou pequena, distante ou próxima, pertence ao aspecto da percepção.
Cada volição, ó monges, seja ela nossa ou alheia, seja ela grosseira ou refinada, grande ou pe-quena, distante ou próxima, pertence ao aspecto da volição.
Cada consciência, ó monges, seja ela nossa ou alheia, seja ela grosseira ou refinada, grande ou pequena, distante ou próxima, pertence ao aspecto da consciência.
Portanto os cinco aspectos da existência são os seguintes: a existência material, a sensação, a percepção, a volição e a consciência.
Desta forma vemos que a crença na existência de um eu imutável é ilusória.
E agora, ó monges, que é o aspecto da existência material?
Este aspecto consiste nos quatro principais elementos materiais e nas propriedades do corpo que dependeu dos quatro principais elementos materiais.
E agora, ó monges, quais são os quatro principais elementos materiais?
Eles são o elemento sólido, o elemento líquido, o elemento calor, o elemento vibratório.
E agora, ó monges, que é o elemento sólido?
Há um elemento sólido que pertence a outros corpos.
E agora, ó monges, que é o elemento sólido que pertence a cada um de nossos corpos?
Quando cada um de nossos próprios corpos, singularizados, se apresenta rígido e sólido, como os cabelos, os pelos, as unhas, os dentes, a pele, os múscu1os, os tendões, os ossos, a medula, os rins, o coração, o fígado, o diafragma, o baço, os pulmões, o estômago, os intestinos, o abdômen, os excre-mentos e qualquer outra parte de nosso próprio corpo, singularizada, que se apresenta rígida e sólida, isto, ó monges, é o elemento sólido de nosso próprio corpo.
Tudo o que é sólido em nosso próprio corpo e tudo que de sólido fora do nosso corpo constitui o elemento sólido. Portanto se devia dizer, de acordo com a realidade e a verdadeira sabedoria, “isto não me pertence, isto não sou eu, isto não é um eu”.
E agora, ó monges, que é o elemento líquido?
Há um elemento líquido interno que pertence a cada um de nossos corpos e um elemento líquido externo que está fora de nosso corpo.
E agora, ó monges, que é o elemento líquido interno?
É o que se apresenta singularizado como líquido e aquoso em nosso corpo, como a bílis, a fleuma, o pus, o sangue, o suor, a linfa, as lágrimas, o soro, a saliva, o muco, o líquido sinovial, a urina e qualquer outro produto que se apresenta singularizado como líquido ou aquoso em nosso próprio corpo. Isto, ó monges, é o que se chama elemento líquido interno.
Cada elemento líquido interno e qualquer outro elemento líquido externo constitui o elemento líquido. Portanto se deveria pensar, de acordo com a realidade e a verdadeira sabedoria, “isto não me pertence, isto não sou eu, isto não é um eu”.
E agora, ó monges, que é o elemento calor?
Distingue-se o elemento calor interno e externo.
E agora, ó monges, que é o elemento calor interno?
Tudo o que se apresenta singularizado, quente, esquentado em nosso próprio corpo, como aquilo que origina o calor e o processo da combustão e por cuja virtude nos volvemos quentes e pelo que o que temos comido, bebido, mastigado e degustado é digerido, ou qualquer outra coisa singularizada que se apresenta quente, esquentada em nosso corpo, isto, ó monges, é chamado o elemento calor interno.
Agora, tudo quanto se acha em estado de calor interno e externo, a isto se chama calor. Portanto se deveria pensar, de acordo com a realidade e a verdadeira sabedoria, “isto não me pertence, isto não sou eu, isto não é um eu”.
E agora, ó monges, que é o elemento vibratório?
Há um elemento vibratório interno e outro externo. E agora, ó monges, que é o elemento vibratório interno?
Tudo aquilo que, em forma singularizada, se apresenta móvel e fugaz no nosso corpo, como os gases ascendentes e descendentes, os gases do estômago e dos intestinos, a inspiração e a expiração ou qualquer outra coisa singularizada que se apresenta móvel e fugaz em nosso corpo, isto, ó monges, se chama elemento vibratório interno. Tudo o que existe pois como elemento vibratório interno e externo, isto constitui o elemento vibratório. Portanto se deveria pensar, de acordo com a realidade e a verdadei-ra sabedoria, “isto não me pertence, isto não sou eu, isto não é um eu”.
Precisamente, ó monges, assim como se chama “casa” o espaço circunscrito e formado por travejamentos de cana, juncos e argila, do mesmo modo, ó monges, chamamos corpo ao espaço circunscrito e formado por ossos, tendões, músculos e pele.
Agora, ó monges, se vosso olho está são e se as formas exteriores caem debaixo do vosso campo visual e há uma correlativa combinação, neste caso se forma a correspondente consciência.
Portanto Eu afirmo, a formação da consciência obedece a certas causas e sem elas não há formação de consciência. Agora, qualquer que seja a causa pela qual possa depender a formação da consciência, de acordo com estas causas se estabelece a relativa formação da consciência.
Cada consciência cuja formação derive do olho e das formas é chamada consciência do olho.
Cada consciência cuja formação derive do ouvido e dos sons é chamada consciência do ouvido.
Cada consciência cuja formação derive do nariz e dos odores é chamada consciência do nariz.
Cada consciência cuja formação derive da língua e do gosto é chamada consciência da língua.
Cada consciência cuja formação derive do corpo e dos contatos corporais é chamada consciência do corpo.
Cada consciência cuja formação derive da mente e das idéias é chamada consciência mental.
Tudo o que é consciência material na consciência, e isto sucede a cada instante, pertence ao aspecto material da existência.
Tudo o que é sensação na consciência pertence ao aspecto da sensação.
Tudo o que é percepção na consciência pertence ao aspecto da percepção.
Tudo o que é volitivo na consciência pertence ao aspecto das volições.
Tudo o que é consciente nas diferentes ocasiões pertence ao aspecto da consciência.
Portanto, ó monges, é impossível explicar o traspasse desta existência a outra nova, ou o crescimento, a extensão e o desenvolvimento da consciência porque ela é dependente da existência material, dependente das sensações, dependente das percepções, dependente das volições. .
Todas as coisas, ó monges, são transitórias. O corpo é transitório, a sensação é transitória, a percepção é transitória, a volição é transitória e a consciência é transitória.
Porém de tudo o que é transitório origina uma dor. E naturalmente de tudo o que é transitório, penoso e sujeito à mutação ninguém pode afirmar “isto me pertence, isto sou eu, este é meu eu”.
Em qualquer parte, ó monges, e de qualquer coisa que pertença à existência material, de qualquer coisa que pertença à sensação, à percepção, à volição ou à consciência, seja nossa ou alheia, seja grosseira ou refinada, seja grande ou pequena, seja perto ou longe, deveria pensar-se dela segundo a realidade e com a verdadeira sabedoria, “isto não me pertence, isto não sou eu, isto não é meu eu”.
Quem, ó monges, experimenta prazer no corpo, experimenta prazer na sensação, experimenta prazer na percepção, experimenta prazer na volição, e experimenta prazer na dor não poderá alcançar a liberação da dor.
Isto eu vos digo, ó monges!
Como podeis rir? Como podeis deleitar-vos com as coisas terrenas?
Na verdade vós marchais nas trevas! Por acaso não haveis visto a um homem, a uma mulher de oitenta, noventa e ainda cem anos, decrépitos, encurvados, deprimidos, apoiando-se num bastão, cambaleando, ofegantes, detendo-se a cada passo, miseráveis, cuja juventude faz tempo desapareceu, sem dentes, com o cabelo embranquecido dependurado sobre as sobrancelhas quase desaparecidas e enrugadas? Então não se lhes ocorreu pensar, “eu também estou sujeito à velhice, sem que de algum modo possa evitá-lo”?
É que acaso não haveis visto nunca a homens e mulheres que, afetados por uma séria enfermidade, se debatem com dor, revolvendo-se em suas próprias defecações e se chegam a levantar-se se vêem obrigados a encostar-se novamente? Então não se lhes ocorreu nunca pensar ”eu também estou sujeito à enfermidade, sem que de algum modo possa evitá-lo”?
É que acaso não haveis visto nunca um cadáver de um, dois ou três dias, tumefacto, lívido, presa da corrupção? Então não se lhes ocorreu pensar, “eu também estou sujeito à morte, sem que de al-gum modo possa evitá-lo”?
Sem princípio nem fim é isto, ó monges, é Samsara.
Incompreensível e desconhecido é a origem dos eus, sepultados na cegueira, que vítimas dos desejos estão sempre sujeitos a novos nascimentos, e assim empurrados através de um período infinito de renascimentos.
Que pensais vós, o monges, que seja maior? Os rios de lágrimas que, chorando e compadecendo, haveis derramado no curso desse longo caminho, sempre correndo apressados em direção à novos nascimentos e novas mortes, apegados ao que não se deveria desejar, separados do que se deveria desejar, tudo isto, ou as águas dos quatro grandes oceanos?
Durante muito tempo haveis sofrido pela morte de uma mãe; durante muito tempo haveis sofrido pela morte de um pai; durante muito tempo haveis sofrido pela morte de um filho; durante muito tempo haveis sofrido pela morte de uma filha; durante muito tempo haveis sofrido pela morte de um irmão ou de uma irmã durante muito tempo haveis sofrido a perda de vossas riquezas; durante muito tempo os há afligido a enfermidade, e durante muito tempo haveis experimentado a morte de uma mãe, a morte de um pai, a morte de um filho, a morte de uma filha, a morte de um irmão ou de uma irmã, a perda das riquezas, a angústia das enfermidades; apegados a coisas não desejáveis, e separados das coisas desejáveis, haveis derramado mais lágrimas no curso desse largo caminho, alternando desde o nascimento até a morte, desde a morte até o nascimento, mais que todas as águas contidas nos quatro grandes oceanos.
Que pensais vós, ó monges, que seja maior? O sangue que por vossas decapitações há corrido sobre este largo caminho, enquanto vós fostes empurrados em direção a novos nascimentos e novas mortes, ou as águas dos quatro grandes oceanos?
Durante muito tempo, ó monges, condenados como assassinos, por causa de vossas decapitações haveis derramado em verdade maior quantidade de sangue que toda a água contida nos quatro oceanos.
Durante muito tempo, ó monges, detidos como ladrões, haveis em verdade por causa de vossas decapitações derramado maior quantidade de sangue que todas as águas dos quatro grandes oceanos.
Durante muito tempo, ó monges, por causa de vossos adultérios, haveis derramado maior quantidade de sangue que toda a água contida nos quatro grandes oceanos.
Porém como isto é possível? Sem princípio nem fim, ó monges, isto é Samsara. Incompreensível é o princípio dos eus, sepultados na cegueira, os que, presa dos desejos, se veem sempre obrigados a novos nascimentos e assim empurrados por um período de nascimentos.
E assim, ó monges, durante muito tempo haveis experimentado a dor, o tormento, a desventura e enchido totalmente as tumbas; em verdade, ó monges, há passado um tempo bastante longo para não ficardes insatisfeitos de qualquer existência; um tempo bastante longo para não vos desapegardes de qualquer dor; um tempo bastante longo para no pordes fim, para não vos liberardes de tudo isto.


O CONTEÚDO DO SEGUNDO PRINCÍPIO

E agora, ó monges, em que consiste o Nobre Princípio da Causa de Dukkha?
Consiste no desejo que origina novos nascimentos, está ligado à avidez do prazer que por aqui ou por ali acha sempre novos gozos.
Consiste no desejo sensual, no desejo pela existência individual no desejo de felicidade durante o tempo.
Porém, ó monges, de onde tem origem esse desejo? De onde ele arranca? Onde tem sua base? Onde se acham suas raízes?
O olho deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
O ouvido deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
O nariz deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
A língua deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha suas raízes.
O corpo deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
A mente deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha suas raízes.
Porém, ó monges, de onde tem origem esse desejo? De onde ele arranca? Onde tem sua base? Onde se achas suas raízes?
As formas deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nelas sua origem, nelas tem uma base e nelas acham suas raízes.
As palavras deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nelas sua origem, nelas tem uma base e nelas acham suas raízes.
Os odores deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem neles sua origem, neles tem uma base e neles acham suas raízes.
Os sabores deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem neles sua origem, neles tem uma base e neles acham suas raízes.
Os contatos corporais deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem neles sua origem, neles tem uma base e neles acham suas raízes.
As idéias deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nelas sua origem, nelas tem uma base e nelas acham raízes.
E mais, ó monges, de onde tem origem esse desejo? De onde ele arranca? Onde tem sua base? Onde se acham suas raízes?
A consciência que nasce do contato do olho deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha raízes.
A consciência que nasce do contato do ouvido deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha raízes.
A consciência que nasce do contato do nariz deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha raízes.
A consciência que nasce do contato da língua deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha raízes.
A consciência que nasce do contato do corpo deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha raízes.
A consciência que nasce do contato da mente deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha raízes.
E mais, ó monges, de onde tem origem esse desejo? De onde ele arranca? Onde tem sua base? Onde se acham suas raízes?
O contato que nasce do olho deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
O contato que nasce do ouvido deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua ori-gem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
O contato que nasce do nariz deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
O contato que nasce da língua deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua ori-gem, nela tem uma base e nela acha suas raízes.
O contato que nasce do corpo deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
O contato que nasce da mente deleita, atrai os homens, por isso esse desejo tem nela sua ori-gem, nele tem uma base e nela acha suas raízes.
As sensações que nascem do olho deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
As sensações que nascem do ouvido deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
As sensações que nascem do nariz deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
As sensações que nascem da língua deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nela sua origem, nela tem uma base e nela acha suas raízes.
As sensações que nascem do corpo deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
As sensações que nascem do pensamento deleitam, atraem os homens, por isso esse desejo tem nele sua origem, nele tem uma base e nele acha suas raízes.
As percepções, as volições, o desejo, o pensamento e as reflexões que têm por objeto as formas, os sons, os odores, os gostos, os contatos do corpo e as idéias deleitam, atraem os homens, por isso esses desejos têm neles sua origem, neles têm uma base e neles acham suas raízes.
Assim, ó monges, um vê uma forma com o olho, cheira um odor com o nariz, prova um gosto com a língua, experimenta um contato com o corpo, percebe uma idéia com a mente, e se a forma, o som, o odor, o gosto, o contato corporal ou a idéia deleitam, atraem, ele é presa de um desejo;
e se a forma, o som, o odor, o gosto, o contato corporal ou a idéia aborrecem, repelem, ele é presa de uma aversão.
Qualquer que seja a sensação que o homem experimente, trate-se de uma sensação agradável, desagradável ou indiferente; o homem a aprova, o homem a acaricia, o homem se apega a ela ou dela tem aversão;
e enquanto a aprova, enquanto a acaricia, enquanto se apega a ela ou dela tem aversão nasce o desejo;
porém o desejo de sensação e o desejo que nasce da aversão quer dizer apego à existência;
e o apego da existência ocasiona o processo da existência; e do processo da existência depende o sucessivo nascimento;
e do nascimento se origina a velhice e a morte, a angústia a lamentação, a pena, a aflição e a de-sesperação;
e desde aí se origina todo um conjunto de dores.
Isto Eu vos digo, ó monges!
Esta é, ó monges, a chamada sagrada verdade da causa da dor.
O desejo de sensação, seja ela agradável, desagradável ou indiferente é o desejo de sensação, ou o desejo que nasce da aversão.
O desejo de percepção, seja ela agradável, desagradável ou indiferente é o desejo de percepção, ou o desejo que nasce da aversão.
O desejo de consciência, seja ela agradável, desagradável ou indiferente é o desejo de consciência, ou o desejo que nasce da aversão.
O desejo sensual, o desejo de existência individual e o desejo de felicidade no tempo é esse desejo.
Em verdade, impulsionados pelo desejo, atraídos pelo desejo movidos pelo desejo, só por vão desejo, os reis guerreiam contra os reis, os príncipes contra os príncipes, os sacerdotes contra os sacerdotes, os cidadãos contra os cidadãos; a mãe luta contra o filho, o filho luta contra a mãe; o pai luta contra o filho, o filho luta contra o pai; o irmão luta contra o irmão; o irmão luta contra a irmã, a irmã luta contra o irmão; o amigo luta contra o amigo.
Assim, presas da discórdia, pelejando e lutando, se lançam uns contra os outros com pedras, bastões e espadas. E assim se precipitam contra a morte, e assim se precipitam contra os golpes mortais.
Porém isso, ó monges, é a miséria do desejo, é a miséria levada pelo desejo, é a miséria mantida pelo desejo.
E além disso, ó monges, atraídos pelo desejo, movidos pelo desejo, só por vão desejo, muitos violam os contratos, subtraem aos demais seus haveres, roubam, defraudam e seduzem mulheres casadas. Então os reis, havendo feito deter a esses delinqüentes, os condenam a ser golpeados com o látego, com as vergas e os bastões; ou a que se lhes cortem as mãos, ou os pés, ou a ambas extremidades; ou a serem esquartejados pelos cães; ou a serem empalhados vivos; ou a serem decapitados. E assim eles se precipitam na morte, e assim eles se precipitam contra os golpes mortais. Porém isto, ó monges, é a miséria do desejo; é a causa visível da dor nascida pelo desejo, levada pelo desejo, mantida pelo desejo, sujeita pelo desejo.
E além disso, ó monges, impulsionados pelo desejo, atraídos pelo desejo, só por vão desejo, os homens marcham por um falso caminho, com ações, com palavras e com pensamentos, e indo pelo falso caminho, com ações, com palavras e com pensamentos, os homens vão à dissolução do corpo, e vão em direção à dor, ainda depois da morte; e vão em direção à ruína; e vão em direção ao desastre. Por isso, eu digo, ó monges, que nem no ar, nem na profundeza dos mares, nem nas cavernas das montanhas, nem em parte alguma do mundo será possível achar um lugar onde alguém possa se esconder e se libertar do resultado de suas más ações.
Porém isso, ó monges, é a miséria do desejo, que é a causa recôndita da dor, nascida do desejo, levada pelo desejo, derivada do desejo, mantida, pelo desejo, sujeita em absoluto pelo desejo.
Dia chegara, ó monges, em que o grande oceano secará, em que o grande oceano se desvanecerá e não existira mais.
Entretanto, ó monges, não terá nunca fim a dor para os homens sepultados na cegueira do desejo, e que por causa do desejo são precipitados no abismo sem fundo de uma série infinita de nascimentos.
Dia chegara, ó monges, em que a maior parte da terra será devorada pelo fogo e não existirá mais.
Entretanto, ó monges, não terá fim a dor para os homens sepultados na cegueira do desejo, e que por causa do desejo são precipitados no abismo sem fundo de uma série infinita de nascimentos.


CONTEÚDO DO TERCEIRO PRINCÍPIO

E agora, ó monges, que é o Sagrado Princípio da Extinção de Dukkha? É a completa extinção desse desejo, o abandono, a recusa desse desejo.
Assim, ó monges, liberados do desejo, liberados do desejo de existir, liberados do desejo de não-existir, não se regressa, não se volve a entrar no processo da existência.
É pela completa e total extinção desse desejo que é o apego à existência, e que é o apego à não-existência, que a existência finalmente cessa.
Cessando o apego à existência, e cessando o apego à não-existência, cessa também o processo da existência; mediante a cessação do processo da existência, cessa também a ação afirmativa ou carma; em virtude da cessação da ação afirmativa ou carma se suprime o nascimento; e não nascendo outra vez terminam a velhice, a morte, as angústias, as lamentações, a dor, a aflição e a desesperação.
Assim, pouco a pouco, tem lugar a cessação de todo esse acumulo de desejos.
Porém isto é a paz, isto é o mais sublime, é o fim de toda existência, o aniquilamento do desejo, o abandono do desejo, a extinção do desejo. Isto é Nibbana.
Pois, estimulados pela avidez, ó monges, irritados pela cólera, cegos pela ilusão, com a mente ofuscada, com a mente encadeada os homens reflexionam sobre a própria desventura e sobre a dos demais, e assim os homens padecem dores mentais e se afligem. De maneira que, se a avidez, a cólera e a ilusão forem arrancadas, os homens não reflexionarão mais sobre a própria desventura, nem sobre a desventura dos demais, e ao mesmo tempo sobre a própria desventura e sobre a desventura dos demais, e assim os homens não sofrerão a dor mental e a angustia.
Portanto, ó monges, o Nibbana é acessível também e ainda nesta vida, e não somente numa futura, o qual é lisonjeiro, atraente e acessível ao Sábio.
O Iluminado, cuja paz nada deste mundo poderá perturbar, é verdadeiramente puro, é livre de angústias, é livre de desejos, e atravessou o oceano desde o nascimento até a velhice. Ele em verdade se compenetra da causa das sensações, sua mente se acha iluminada. E para um sábio assim liberado, em cujo coração mora a paz, não faz falta nenhuma consideração sobre o que tenha feito, e para ele nada mais há que fazer.
Assim como a rocha de uma sólida montanha não cambaleia pela ação do forte vento, nem o som, nem o odor, nem o gosto, nem os contatos corporais, nem o desejável nem o indesejável, nada pode a semelhante Indivíduo ocasionar alguma mudança. Sua mente está firme, atenta e concentrada, desperta e iluminada, e ele conseguiu sua total liberdade.
Em verdade, ó monges, existe uma condição onde não existe nem sólido, nem líquido, nem calor, nem movimento, nem este mundo, nem outro mundo, nem Sol, nem Lua. A isto, ó monges, Eu o chamo nem surgimento, nem morte, nem ficar, nem ir, nem nascer, nem morrer. E nessa condição não se encontra nem substância, nem desenvolvimento, nem base. E nisto está o fim da dor.
Existe, ó monges, um não-nascido, um não-criado, um não-originado, um não-chegado, um não-formado. Se, ó monges, não houvesse um não-nascido, um não-criado, um não-originado, um não-chegado, um não-formado, não seria possível sair do mundo do nascido, do criado, do originado, do chegado, do formado.
Porém, ó monges, como existe um não-nascido, um não-criado, um não-originado, um não-chegado, um não-formado é possível sair do nascido, do criado, do originado, do chegado, do formado.
O Nibbana é a completa cessação da sede; é desistir, renunciar, emancipar-se e desapegar-se de-la.
E é acalmar todos os aspectos da existência, o afastamento das corrupções, a extinção da sede, o desapego, a cessação.
Ó monges, que é o Absoluto? É, ó monges, a extinção do desejo, a extinção do ódio, a extinção da ilusão.
Aqui não cabem os quatro elementos, nem o sólido, nem o líquido, nem o calor, nem o movi-mento; nem as noções de longitude e latitude, de sutil e baixo, de bem e de mal, de mente e de corpo, e não podem ser achado, nem este mundo, nem outro mundo, nem um devir, nem um partir, nem estar de pé, nem a morte, nem o nascimento, nem os objetos dos sentidos. Nibbana é Liberdade. A vida pura há sido vivida, e consumado o que se devia fazer, nada mais há a fazer.
A Pessoa que está assim dotada, está dotada também da sabedoria absoluta, porque o conhecimento da extinção total de Dukkha é a Nobre e Absoluta Sabedoria, a qual é a Realidade mesma, a qual é a Verdade mesma.
O Nibbana não é mesmo o resultado natural da extinção do desejo, porque o Nibbana não é re-sultado de nada. É o não-produzido, o não-condicionado. Há um Caminho que conduz à experiência do Nibbana, mas o Nibbana não é o resultado do Caminho. Não há um Eu que experimenta o Nibbana.
Neste corpo sensitivo de seis pés de altura Eu enuncio o mundo, o surgimento do mundo, a cessação do mundo e o Caminho que conduz à cessação do mundo.
Aquele que há experimentado o Nibbana é o mais feliz dos seres ó monges, o Nibbana é felicidade; sim, o Nibbana é felicidade.
Não há desgraça para quem terminou sua viagem, abandonou todo o cuidado, liberou-se em to-das as partes, de todos os apegos.
De quem se libertou é tão difícil a rota como a de um pássaro voando. Os próprios deuses O veneram. Pois ele rompeu todas as cadeias, e conheceu o Incriado.
Se isto tem origem no nascimento daquilo, teremos: as formação cármicas são condicionadas pela ignorância; a consciência é condicionada pelas formações cármicas; a psicofisiologia é condicionada pela consciência; as seis esferas sensitivas são condicionadas pela psicofisiologia; o choque sensorial é condicionado pelas seis esferas; a sensação é condicionada pelo choque sensorial; o apetite é condicionado pela sensação; a avidez é condicionada pelo apetite; o devir é condicionado pela avidez; o nascimento é condicionado pelo devir; o declínio, a morte, a pena, a tristeza, sofrimento, a queixa, o desespero são condicionados e têm como causa o nascimento. Tal é a formação de toda essa massa de angústia. Mas do desaparecimento completo da ignorância deriva o fim das formações cármicas; do fim das formações cármicas depende o fim da consciência; da supressão da consciência depende a supres-são da psicofisiologia; do desaparecimento da psicofisiologia depende o desaparecimento das seis esferas sensoriais; suprimidas as seis esferas, o choque sensorial desaparece; acabado o choque sensorial acaba a sensação; acabada a sensação, acaba o apetite; acabado o apetite, acaba a avidez; sem avidez não há devir; sem devir não há nascimento; sem nascimento, deixam de existir a velhice e a morte, a pena, a tristeza, o sofrimento, a queixa e o desespero. E assim produz a supressão de toda essa massa de angústia. A verdade da cessação tem, como característica, a paz. A sua função não é morrer; ela se manifesta pela ausência de sinal.


CONTEÚDO DO QUARTO PRINCÍPIO

E agora, ó monges, qual é o Sagrado Princípio do Caminho que conduz à extinção do sofrimento?
Entregar-se ao sensualismo, ao abjeto, ao usual, ao vulgar, ao ímpio, ao prejudicial, é o mesmo que entregar-se à auto-mortificação, ao doloroso, ao torturante. A ambos extremos o Perfeito há rechaçado, e há encontrado o termo médio que permite vê-los e conhecê-los, e que conduz à paz, e que conduz ao discernimento, à iluminação e à Extinção, e ao Nibbana.
O termo médio é o Óctuplo Caminho, o Caminho de oito partes interligadas, o caminho que conduz à extinção do sofrimento.
E quais são, ó monges, as Oito Partes do Caminho?
A Samma Ditthi, ou Reta Compreensão; a Samma Sankappa, ou Reto Pensamento; que pertencem ao aspecto da Sabedoria.
A Samma Vaca, ou Reta Palavra; a Samma Kammanta, ou Reta Ação; e a Samma Ajiva, ou Reto Viver; que pertenceu ao aspecto da ética.
A Samma Vayama, ou Reto Esforço; a Samma Satí, ou Reta Atenção; e a Samma Samadhi, ou Reta Concentração; que pertencem ao aspecto da Mente.
Este, ó monges, constitui o Caminho Médio que o Perfeito há descoberto, o que ao mesmo tempo faz ver e conhecer; conduz à paz, ao discernimento, a Iluminação e à Extinção do sofrimento, livre de lamentações, livre de penas, e guia sempre para a liberdade, e igual a este Caminho não há outro.
Se vós seguis este Caminho certamente encontraras o fim da dor.
E não busqueis auxílio em outra parte, pois cada um deve prover-se a si mesmo.
Escutai, ó monges, porque se há descoberto a imortalidade. Eu a descobri, Eu a ponho diante de vós. Como Eu a tenho descoberto, agi vós de tal forma que também a possais experimentar por si mesmo, pois o Perfeito só pode indicar o Caminho. Agi de tal forma que, em tempo relativamente breve, vê-la-eis, a Imortalidade, de frente, realizada e experimentada, ainda nesta vida, a ela, a meta suprema de suprema beatitude. Para alcançar este Marco, filhos de famílias ilustres abandonam suas casas a fim de levar uma vida sem teto e manifestam, realizam e conseguem a perfeição e a beatitude ainda em vida.
Livre da dor e da tortura é este Caminho, ó monges, livre de lamentos e sofrimento, é um Caminho Perfeito. Verdadeiramente como este não existe outro para a purificação dos seres e seguindo este caminho poreis fim ao sofrimento e a morte. Mas cada um tem que compreender e fazer por si próprio, pois apenas posso aponta-lo.
E qual é, ó monges, a Palavra Correta? Abster-se de mentir e de caluniar é a Palavra Correta, abster-se de levar e trazer conversas que causem desarmonia e discórdia é a Palavra Correta, abster-se de palavras pesadas, duras e ofensivas é a Palavra Correta, abster-se da tagarelice e das conversas frívolas é a Palavra Correta.
E qual é, ó monges, a Ação Correta? Abster-se de destruir os seres vivos é Ação Correta, abster-se de tomar para nós aquilo que não nos pertence é Ação Correta; abster-se de errôneo comportamento sexual como infidelidade, adultério, prostituição, abastardamento é Ação Correta; abster-se de tóxicos e bebidas alcoólicas que causam a destruição da inteligência é Ação Correta.
E qual é, o monges, o Meio de Vida Correto? Abster-se de profissões como caçador, pescador, abatedor é Ação Correta; abster-se do comércio de armas e de drogas é Ação Correta; abster-se de um Meio de Vida que não seja honesto, para o bem comum, não prejudicando nem explorando a comunidade.
E qual é, ó monges, o Esforço Correto? Há, ó monges, quatro grandes esforços: o esforço de eliminação, o esforço de domínio, o esforço de reprodução e o esforço de conservação.

O que é, o monges, o esforço de eliminação? Quando o monge consegue que na sua vontade não apareçam as coisas malsãs que não devem aparecer, e chamando em seu auxílio toda a energia sacode, incita e estimula sua mente; quando, ó monges, o monge vê uma forma com o olho, ouve um som com o ouvido, sente um odor com o nariz, prova um sabor com a língua, sente um contato com o corpo, percebe um objeto mental com a mente, e não se detém no aspecto dessas coisas, nem no todo nem em parte, mas as observa como são, e consegue em si mesmo observar os seus sentidos, e deste modo, observando os seus sentidos, consegue manipulá-los, e manipulando os sentidos experimenta um senti-mento de alegria em manipulá-los, isto é, ó monges, o que eu chamo de Esforço Correto de eliminação.
E agora, o monges, o Esforço Correto de domínio? Quando, ó monges, o monge desenvolve em si mesmo a vontade de dominar os maus estados mentais que surgiram em sua mente, e apelando para toda a sua energia sacode, incita e estimula sua mente, não permitindo que a avidez, a cólera invejosa e a ilusão se apresentem e lancem suas raízes, e suprime, aparta, destrói, obrigando a desaparecer estes estados mentais, isto, ó monges, é o Correto Esforço de domínio.
E agora, ó monges, o Esforço Correto de reprodução? Quando, o monges, o monge consegue em si mesmo engendrar as boas coisas mentais que não haviam aparecido, apelando para todas as suas forças, sacode, incita e estimula a sua mente fazendo produzir as partes constitutivas da Iluminação, o desapego, a extinção da avidez do desejo que conduz à liberação, e principalmente quando consegue produzir a Atenção, a Penetração, a Energia, a Alegria, a Tranqüilidade, a Concentração e a Equanimidade, isto e, é monges, o que se chama Esforço Correto de reprodução.
E agora, ó monges, o que se chama Esforço Correto de Conservação? Quando, ó monges, o monge consegue desenvolver em si mesmo estas coisas boas que levam à liberação e não permite que elas se enfraqueçam, mas trata de aperfeiçoá-las, isto é o Esforço Correto de conservação.
E qual é, ó monges, a Plena Atenção Correta? A atenção sobre o corpo, a atenção sobre as sensações, a atenção sobre os estados de consciência, a atenção sobre os objetos da mente, isto, ó monges, é a Plena Atenção Correta.
E qual é, ó monges, a Concentração Correta? É a mente unipolarizada, ó monges, a mente voltada para um só ponto.
E qual é, o monges, a Correta Compreensão? Compreender as Quatro Nobres Verdades, compreender as três características da existência, compreender as ações meritórias e sua raiz, compreender as ações demeritórias e sua raiz, isto, ó monges, é a Correta Compreensão.

Desprovido da Correta Compreensão, o homem comum é dominado pela ilusão da existência de um “eu”, pela dúvida, pelo apego aos rituais, pelo desejo sensual e pela raiva. E o livrar-se destas coisas ele em realidade não sabe. Não sabendo o que é digno de saber, e sabendo o que é indigno, não se liberta destes cinco grilhões. O Nobre Monge, entretanto, sabe o que é o sofrimento, sabe a origem do sofrimento, sabe a extinção do sofrimento e sabe o caminho de oito pontas que leva a extinção do sofrimento.
A três características da existência são a impermanência, a insatisfatoriedade de todas as coisas e a impessoalidade de todo o agregado de coisas que dão a ilusão de um “eu”. Assim como uma bolha de água é vazia e insubstancial, da mesma forma somos vazios e insubstanciais.
Meritórias são as ações em cuja raiz estão a renúncia, o desapego, a boa vontade, a benevolência e o amor. Demeritórias são as ações em cuja raiz estão a cobiça, o ódio, a ilusão, a avidez do desejo, a ignorância e o egoísmo. E isto temos ver, ó monges.
Meritórias são a generosidade, a moralidade, a meditação, a reverência, a gratidão, a respeito, o serviço, a transferência de mérito, a alegria com o sucesso dos outros, o ouvir a Doutrina, o expor a Doutrina, os corretos pontos de vista e a correta compreensão.
E o que é, ó monges, o Pensamento Correto? São os pensamentos fundados na renúncia e no desapego, na boa vontade, na benevolência e no amor, na bondade, na camaradagem e livres do ódio, da inveja, da cobiça, do egoísmo, da vaidade, da ilusão e da ignorância do que é.


Quando esta explanação acabou de ser dita nasceu no Venerável Kondanna o Olho, e ele exclamou: “Seja o que for que haja, qualquer natureza que nasça tem a qualidade de extinção”.
Quando a roda da Doutrina foi posta para rolar pelo Senhor, os devas do planeta proferiram a novidade: “Pelo Senhor, em Baranasi, Isipatana, no parque das gazelas, a insuperável Roda da Doutrina foi posta a rolar, a qual nunca foi posta a rolar por nenhum recluso ou brâmane, deva, mara ou por ninguém neste mundo”. Tendo ouvido esta notícia dos devas, os Catummaharajika proferiram a noticia, que foi ouvida pelos devas Tavatimsa, que proferiram a notícia, que foi ouvida também pelos Yama devas, que a proferiram, que foi ouvida pelos Tusitas devas, que a proferiram, que foi ouvida pelos Nimmanarati devas, que a proferiam, que foi ouvida sucessivamente pelos Paranimmitavasavatti devas, pelos Brahmaparisajja devas, pelos Brahmapurohita devas, pelos Mahabrahma devas, pelos Parittabha, pelos Appamanabha devas, pelos Abhassara devas, pelos Parittasubha devas, pelos Appainanasubha devas, pelos Subhakinhaka devas, pelos Vehapphala devas, pelos Aviha devas, pelos Atappa devas, pelos Sudassa devas, pelos Sudassi devas. Tendo ouvido a notícia dos Sudassi, devas os Akanitthaka devas proferiram:
“Pelo Senhor, em Baranasi, Isipatana, no parque das gazelas, a insuperável Roda da Doutrina foi posta a rolar, a qual nunca antes foi posta a rolar por nenhum recluso ou brâmane, deva, mara ou por ninguém neste mundo”. Então neste momento o rumor e alarido dos devas levantou o mundo dos deuses. E os dez mil universos estremeceram, sacudiram e ficaram abalados. Grandes luzes ilimitadas apareceram nos mundos dos deuses. Então o Senhor exclamou com alegria: “Na verdade meu querido Kondanna despertou no conhecimento”. E por esta razão Annakondana ganhou o nome de Venerável Kondanna.
(Pelo mérito dessa leitura, que todos os seres alcancem a Felicidade!).



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Tradução e estabelecimento do Texto do Sutta-Pitaka por R.Samuel a partir da seguinte bibliorafia:
1. CATUBHANAVARAPALI. Translation by Lionel Lokuliyaba. Colombo, Gunase- kera Trust, s/d. 179 p. (O Livro dos Quatro Recitais, ou: Grande livro das proteções).
2. NYANATILOKA, Bikku. El Buddjo. Trad. e into. de A.M.D. Buenos Aires, Via Lu-cis, 1944. 260 p.
3. ---------. The word of the Buddha. Compiled, translated and explained by. Kandy, Buddhist Publication society, 1968. 97 p.

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