A PAZ AO ALCANCE DE TODOS
(Manual para a prática da meditação)
SMRTYUPASTHANA SHASTRA
BIKKU MANGALO
PREFÁCIO
A Prática da Concentração (Satipatthana) é uma das práticas
básicas do Budismo. O Budismo é famoso, entre a família das religiões, pela clareza
da sua aproximação prática, não dogmática, na questão relativa à realização da
Verdade. Não é surpreendente, portanto, quando encontramos, exatamente, no
coração do Budismo, uma ênfase especial na necessidade do treinamento da mente,
a fim de se atingir maior consciência e claridade. Isto é obtido atravós de
recursos razoáveis e práticos, simples, que permitem manter a mente focalizada
no presente. Naquilo que é, aqui e agora. Mas isto é algo mais do que simples
assunto de treinamento mental ou um expediente no sentido de um “instrumento”,
pois a Verdade é aquilo que é. A mente assim treinada, focalizando o simples
presente diante de nós, sem a cortina de fumaça das preferências e pensamentos
associados, através da qual vemos não aquilo que é, mas aquilo que pensamos a
respeito dessa realidade, pode atingir algo que em si mesmo é a “porta para a
Imortalidade”. Algo simples, direto, obtido na realização do incriado e,
portanto, imortal. Aquela realidade que está sempre em nós, no coração do nosso
Ser, oculta pelo véu de pensamentos ignorantes.
O mundo moderno, claramente, tem sede por uma nova
aproximação prática, não dogmática, porém científica, para a realização das
verdades perenes que qualquer um, indistintamente, sabe que existem. Mas que
sentimos obscurecidas, pois não possuimos o contato pessoal, direto, com elas,
em virtude de religiões dogmáticamente organizadas. Desta forma, a palavra
“religião” adquire nas mentes de algumas pessoas uma associação deformada. É
uma pena, pois elas voltarão em desespero as costas a essa “religião” buscando
verdades para as quais somente a Religião, no seu verdadeiro sentido, pode
permitir acesso. Esta sede para aproximação prática, não dogmática, pode ser
saciada através simples prática da Concentração, que é na verdade o “coração da
meditação Budista”.
A prática da Concentração tem uma vantagem adicional. O
indivíduo, tendo adquirido o seu hábito em meditar, pode e na verdade deve
praticá-lo em todas as horas através do dia, qualquer que seja sua ocupação.
Não é um exercício de “meditação” limitado a ficarmos “sentados” de uma maneira
formal. É verdadeiramente uma nova maneira de viver. Um intensificado estado de
consciência no qual, em virtude de permanecermos no presente em vez de
envolvidos num nevoeiro de fantasias, a vida será vivida mais plenamente. Longe
de interferir com nossa vida e as funções do dia-a-dia, a paz e a clara
consciência surgidas tornam o indivíduo muito mais senhor de si mesmo e com a
cabeça mais clara nos seus julgamentos. Esta é uma das maiores glórias desta
prática. Ela é aplicável em todas as horas e situações.
Estritamente falando, a Concentração não é uma propriedade
exclusiva do Budismo. É a própria essência da vida espiritual, onde a religião
foi tomada no seu nível mais alto. Uma atividade de tempo integral daqueles
seres verdadeiramente dedicados e que são encontrados em todas as religiões. A
outra alternativa é a vida de esquecimento, movida por impulso, senti-animal,
com todas as suas conseqüências. O nome Concentração pode variar. Pode ser
chamado Plena-Atenção, guarda do coração, atenção, sobriedade, domínio dos
sentidos, viver em Samadhi, mauna, o silêncio do coração, vazio, santa
indiferença, equanimidade, Samatha e Vipassana, Samadhi de Prajna, acittata, o
pensamento sem suporte, morte do ego, eliminação do pensamento discursivo,
visão daquilo que deve ser visto, e uma procissão de outros nomes. Todos,
entretanto, vêm a ser no fim a mesma coisa. Assim como a chamada prática da
presença de Deus vem a dar no mesmo, pois é somente através da concentração
constante que pode mos estabelecer a consciência na mente. “É a vontade de Deus
agindo através de mim. Eu sou somente o seu instrumento”, bem como método o Hua
Tou do Zen, ou o método de Ramana Maharshi de perguntar constantemente: “Quem
sou eu?” Todos chegaram ao mesmo lugar. É através da Concentração que podemos
ver o pensamento assim que ele surge. Antes que ele siga urna cadeia de
associações. Pela concentração chegamos a ver o “onde”, e “para onde” ele vai,
quando o indivíduo compreende aquilo que realmente não surge nem passa. É por
isso que o Buda descreve a Concentração como sendo o “único caminho”,
prometendo que “a Concen tração conduz a imortalidade”, advertindo que o
esquecimento é a morte”.
Embora não seja, de qualquer forma, uma prerrogativa do
Budismo foram, entretanto, os ensinamentos do Buda que deram maior ênfase a
prática da Concentração, bem como as mais claras restrições do como colocá-la
em prática. Uma coisa é chegar a referências enigmáticas, fragmentárias, em
escritos deixados por algum obscuro místico, outra, completamente diferente, e
ler as claras e detalhadas descrições a respeito da prática como um tema
central encontrado nos discursos da suprema autoridade dessa grande religião.
Isto não é surpreendente pois, como dizia o falecido Arcebispo de Canterbury,
“o cristianisnio é a mais materialista de todas as religiões”. O Budismo pode
bem proclamar-se como sendo a mais prática e precisa. Nada omite que seja de
valor prático e essencial. Nada acrescenta que seja de interesse puramente
teórico. O Buda frequentemente desprezava discussões especulativas por não
terem significação prática. Ele, por firme determinação não ensinava dogmas —
mesmo que verdadeiros — para serem aceitos pela fé ou intelecto. Conduzia, em
vez disso às pessoas, homens comuns, à realização direta, pessoal, da verdade
através de si mesmos desde que, como todos condordam, a Verdade Última está
além do intelecto. Ele preferia trazer as pessoas face a face com essa verdade
através a Concentração em vez de conduzi-las pela Senda Florida da Sofisticação
Intelectual.
Essa prática de Concentração, tão central no Budismo, e
tratada com detalhes nos textos canônicos que registraram os discursos do Buda,
particularmente no “Discurso para a prática da concentração” (Satipatthana
Sutta).Há naturalmente, a usual quantidade de trabalhos comentando o assunto.
Existem também vários livros escritos por ocidentais a respeito da prática.
Dentre eles nota-se “O coração da meditação Budista”, pelo Ven. Nyanaponika. A
prática, entretanto, é ensinada sistematicamente no Oriente, especialmente em
Burma. Há uma revitalização no interesse nesta técnica tão antiga e, no
entanto, eminentemente moderna que se difundiu em muitos países, entre os quais
a Inglaterra.
Gostaríamos de apontar um afastamento no método de
desenvolver a Concentração que aqui será exposta da maneira que é ensinada na
Birmânia, onde a prática é conhecida, comumente, sob o nome de um dos seus
pseudônimos — Vipassana. Na Birmânia é costume praticar a “Concentração na
respiração” com a atenção colocada no movimento do abdomem durante a
respiração. Isto é feito simplesmente para facilitar a observação pois muitas
pessoas acham mais fácil, particularmente no começo, centralizar a atenção no
movimento grosseiro do abdomem em vez da sensação do ar ao atravessar as
naririas. Entretanto, não podemos negar que as descrições clássicas da prática,
encontradas nos discursos do Buda e os seus comentários mais antigos,
claramente indicam a face como sendo o local ideal para centralizar a atenção.
Tal coisa tem gerado alguma oposição à prática como é ensinada na Birmânia,
baseada na alegação de ser “uma inovação”. Muitas dessas críticas são
tendenciosas e mesmo a crítica sincera tende a aumentar a importância desse
pequeno detalhe além da sua proporção. Algumas pessoas tem sido mesmo
desencorajadas, deixando de receber os benefícios da prática, o que é uma pena.
Para desmanchar tais críticas, a respeito de detalhes menores e essencialmente
práticos, preferimos frisar que no ensinamento da atenção ambas as es colas
trabalham da mesma forma. Além desse pequeno detalhe a prática aqui escrita é
revivida e popularizada na Birmânia sob a adequada orientação de Mahasi Sayadaw
em Sasana Yeikta, Rangoon. Temos toda confíança que aqueles que a aplicarem
encontrarão a mais simples e prática “porta para a imortalidade”.
‘Tende que fazer o esforço. Os Budas mostram o caminho”.
Centro de Meditação Budista-Biddulph.
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PRÁTICA DA CONCENTRAÇÃO — O MACACO LOUCO
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A melhor maneira de começar é ver onde devemos começar.
Olhemos a mente de uma pessoa comum. Mundana. O que encontramos é a
mente-gafanhoto, a mente-borboleta, caçando suas fantasias e impulsos do
momento.Uma simples presa de estímulos e reações emocionais. Reações que são
largamente, permanentemente condicionadas. Cegas. Uma cadeia de associações
unidas, esperanças, medos, memorias, fantasias, lamentações, jorrando
constantemente através da mente. Desencadeadas pelo contato momentâneo com o
mundo externo dos sentidos. É uma busca cega, incessante, insaciável, por
satisfação. Sofrimento sem finalidade e confusão. Isto não é realidade, mas um
sonho desperto, uma sequência de conceitos e fantasias. O mundo está
subdividido em inúmeras formas identificáveis, reconhecíveis. Cada uma delas
tem seu nome e na base destes nomes, — imagens conceituais da realidade em nossa
volta — a mente tece o manto do pensamento no qual termina se embaraçando. Os
objetos mudam, mas seu “nome” permanece o mesmo. A mente aferrada a nomes
vazios e imagens, perde ocontato com a realidade ao tentar encontrar, nos
produtos de sua própria imaginação, a satísfação e segurança que anseia. Não
admiraque a mente tenha sido chamada “a fábrica da ídolos”. Não admira também
que o Buda a tenha descrito como um macaco inquieto, de galho em galho, em
busca do fruto que o satisfaça através da infindável selva de eventos
condicionados. A futilidade, a irrealidade e frustração, inerentes a tal modo
de existência, é tão auto-evidente quando o indivíduo principia a ver
claramente. A finalidade do Budismo, e da religião em geral, é reunir o
indivíduo com a realidade que perdemos de vista devido nossa ignorância ao
buscar a felicidade que ansiamos ou de não é encontrada: — nas sombras e
ilusões de nossa própria mente. Uma das maravilhas paradoxais desta nossa
época, que gosta do autocognominar-se “científica”, é o fato de o homem moderno
deixar sua mente continuar essa cega e atormentada corrida de rato numa
confusão indisciplinada.. Ao longo do tempo o homem acumulou uma quantidade
fenomenal de informações — conceitos — acerca de nomes e formas que habitam no
Universo e controlou, disciplinou as forças da Natureza que teriam destruído
seus avós. Para obter energia elétrica construiu estruturas de tamanho e custo
enormes à custa de dinheiro e trabalho, barrando grandes rios e correntezas.
Entretanto, sua própria natureza o ilude. O conhecimento da realidade lhe
escapa e ele, inexplicavelmente, não faz o menor esforço pa ra disciplinar seus
próprios pensamentos. Mesmo quando começa a perceber a maneira que eles o
iludem e atormentam.
Uns poucos, através de incontáveis gerações, nadando contra
a correnteza dos mo deles humanos, desempenharam essa tarefa. Sofreram com isso
inúmeras privações, desencorajamento, quando no inicio, às cegas e sem
instrutor, tentaram achar o Caminho. Alguns conseguiram triunfar, outros tropeçaram
com inúmeros sofrimentos, todavia todos, no final, declaram, em línguas
diferentes, que encontraram “algo”. “Algo” que uma vez encontrado permite que
se conheçam todas as coisas. É o Incriado, a única Realidade perdurável. O
nosso próprio Ser e sua “descoberta” é, todos concordam, a suprema felicidade
ao lado da qual todo o sofrimento de idades subitamente se torna completamente
insignificante. E, de uma forma estranha, mas certa, todos que encontram esse
“Algo” encontram o estado além da vida e morte. Algo além dos sentidos, embora
nele resida o poder através do qual vemos, ouvimos e pensamos. Esse “Algo” está
velado pelo fluir de pensamentos ignorantes que nos impedem a visão do que “é”
que nos deixam ver somente aquilo que pensamos a seu respeito. É a velha
história do homem que vendo um pedaço de corda dependurado numa árvore, com
pouca luz, considera-a como se fosse uma serpente e entra em pânico. Desta
forma as coisas ocorrem.. Tomamos nossos pensamentos, meras imagens da
realidade, pela própria realidade permitindo que emoções sejam estimuladas por
eles. As emoções, por sua vez, produzem mais pensamentos no desejo de
satisfazer a perturbação e, assim, o círculo vicioso se completa. O fato é que
não podemos pensar a respeito da realidade se não a conhecemos. Sem o jôrro dos
pensamentos não haverá emoções perturbadoras. A mente estará em paz não
havendo, então, necessidade de pensar.
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A PARALIZAÇÃO DO
PENSAMENTO CONCEITUAL
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O primeiro passo, portanto, e cortar a cadeia de conceitos e
palavras associados que inundam nossa mente. Devemos sustar nova invasão
mantendo a Concentração no presente, naquilo que é. O Buda, num verso famoso
assim costumava falar:
“Não corras atras do passado,
Não busques o futuro.
O passado, passou.
O futuro ainda não chegou.
Vê, claramente, diante de ti o Agora,
quando tiveres encontrado
e viveres o tranquilo e imóvel estado mental”.
Este é o começo de uma disciplina mental e o recordar para
assim agir é Concentração. Sem esta Concentração o jôrro de pensamentos
principia novamente, agitando, nos entristecendo e maculando a mente como a
água lamacenta de om lago no qual o vento forma ondas. A claridade da visão,
paz da mente, e autoconcentração serão perdidas num simples instante. Por essa
razão o Buda chamava a Concentração “o único Caminho”. Um caminho que ele
precisamente descrevia numa metáfora:
“Quaisquer que sejam as correntezas fluindo no mundo, a
Concentração é a barragem que as retém”.
Quando o “rio Jordão” é barrado, o “povo escolhido” cruza-o
de pés secos até a “Terra Santa”. Ou como é dito no Zen:
“A mente louca não pára. Se parar, é a Iluminação”.
A prática da Concentração é um treinamento gradual. A
perfeição na autoconcentração é a “Arte das Artes”, a “Ciência das Ciências”
para a qual um aprendizado adequado é necessário, O treino de nossa própria
mente — (“nossa” nos devidos termos) — é mais duro do que o treinar um cão ou
cavalo pois a mente não é menos forte e possui, além disso, todos os truques e
ingenuidade humana para encontrar o caminho, a fim de ficar sem controle.
Todavia este é um treino valioso, trazendo em si, já nos primeiros estágios,
grande paz e alegria e inúmeras riquezas no curso de treinamento. Há pouca
esperança de obter a felicidade com uma mente voluntariosa e não concentrada —
mesmo que seja a simples felicidade de uma vida pacífica, com finalidade e
equilibrada. Como podemos esperar então alcançar o supremo objetivo da vida?
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QUE CONCENTRAÇÃO?
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Mas o que é prática
da Concentração? Como nos situar em
relação a ela? Concentração é simplesmente o estabelecimento da atenção, com
plena consciência, no aqui e agora. É o “pensamento sem suporte”, a “mente
veloz” e o verdadeiro “silêncio Ariano”. À medida que cada objeto surge na
consciência através das seis entradas (os cinco sentidos e a imaginação) deve
ser visto como ele é sem dar boas vindas ou re jeitar. Sem nos aferrarmos a ele
ou tentarmos pô-lo de lado. Mas, simplesmente, deixando-o como “se ele fosse um
pedaço de madeira podre”, como o grande Huang Po costumava dizer. Esta é a
verdadeira significação do “Caminho do Meio” do Budismo: — ver cada um (e
todos) objetos assim como eles surgem, com a mente “alerta”, plenamente
consciente evitando seja o apego ou a aversão a qualquer coisa. Isto é: — “não
desgostes e tudo claro se tornará”, O Buda costumava definir a Concentração da
consciência como ver o surgir, a presença e o passar de todas as percepções
sensações e pensamentos. “Ele inúmeras vezes costumava dizer que seus
ensinamentos, em resumo, “eram”: veja somente o visto naquilo que se vê e ouça
somente aquilo que se escuta nas coisas ouvidas”! É tudo a mesma coisa.
Mas quando tentamos fazer isso que encontramos? Vemos que,
primeiramente fazer isso, mesmo por poucos minutos, é completamente impossível.
A mente é varrida por uma verdadeira correnteza de pensamentos em erupção
(ASAVA) e uma inquietação que torna impossível sermos claros e detalhados
bastante para evitar reações aos pensamentos e objetos que surgem. O indivíduo
nem pode começar: É por essa razão que o Buda em sua sabedoria, compaixão e
“perícia nos meios” ensinou a “Prática da Concentração” como o método gradual
de treinamento através o qual, de um caos inicial e confusão de uma mente
indisciplinada, e com a vontade de um touro, ela pode deixar de “cultuar
estranhos deuses” e tornar-se tranquila e conhecendo, por fim, AQUILO QUE É.
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BASES DA CONCENTRAÇÃO
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Em primeiro lugar, uma palavra de advertência. O “‘Samadhi”
adequado, ou a tranquilidade mental, o último passo na Nobre Senda Óctupla do
Buda que leva à realidade, é somente possível com a correta Concentração. É o
passo que conduz a ela. De modo semelhante esta Concentração depende dos passos
precedentes, isto é: da Compreensão Correta, Moralidade e Determinação. Tem que
haver pelo menos uma boa base para a Compreensão a fim de entendermos a
futilidade do transitório e do condicionado à luz do Não-condicionado e de
todos os objetos quando o indivíduo está olhando para “si” — o sujeito. A mente não poderá se libertar o
suficiente do pensamento a respeito de objetos em constante mutação a não ser
através da prática da autoconcentração no aqui e agora. Ela quererá paralisar o
pensamento a respeito dos seus ídolos pois, onde estiver, nosso tesouro
(Ratana) estará e, também, o nosso coração (Citta). De maneira semelhante a não
ser que tenhamos uma boa base numa atitude moral para a vida, a Concentração
será construída em areia. Uma consciência má é como a água turva que impede a
visão clara da “coisa como ela é”.
Sem paz na mente há pouca esperança na paralisação do fluir
dos pensamentos apesar que tenhamos toda a determinação do mundo. Mesmo assim é
quase impossível. Naturalmente nenhum de nos é perfeito — longe disso — todos
fracassamos deixando de viver a vida que sabemos certa. Mas, a não ser que
coloquemos em ação um esforço sincero para viver os preceitos básicos Budistas,
estaremos acelerando e freando ao mesmo tempo. Mais tarde uma crescente
autoconsciência e paz trarão maior autocontrole. Mas pelo menos uma sincera
vontade e esforço para o bem deverá existir e sincero arrependimento (e se
possível restituição) por qualquer mal feito. Acima de tudo a mente tem que
começar a afastar-se dos modelos antigos. Este é o verdadeiro significado do
“arrependimento” — (metanoia).
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UM CURSO DE CONCENTRAÇÃO
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A melhor maneira para aprender a Prática da Concentração é
tomar um “curso” sob a direção de um instrutor competente. Nesse caso,
devemo-nos colocar, sem reservas, nas suas mãos e seguir a prática, exatamente,
como for recomendada.
As instruções que se seguem destinam-se somente para
referência e guia básica quando sentimos a necessidade de seu uso. E também
para aqueles que, por qualquer razão, não puderem praticar sob a orientação de
um instrutor, mas que desejarem fazer um esforço por si mesmos. Com um
instrutor as dificuldades são muito reduzidas, pois ele poderá testar o
progresso através de relatos diários, corrigindo qualquer perigo nascido da
incorreta aplicação dos princípios da prática. É de grande auxílio o sentimento
de confiança produzido pela prática sob a direção de um instrutor, mesmo que
seja por um curto período. Muitas pessoas sentem que a entrevista diária com
seu instrutor aplaina dificuldades específicas, agindo como uma espéie de
“recarga” nas suas baterias de imaginações e determinações. Sentir que as
coisas não estão indo bem não é necessariamente uma prova de que elas estão
indo mal. Na verdade pode ser o sinal de progresso pois pelo menos a pessoa
esta começando a ver a forma errada como está sendo feita a prática. Em outras
palavras, começamos, por fim, a ver as coisas com mais claridade. Apesar disso
podemos subjetivamente não ter consciência no momento e nos alegrar quando, a
pós descrever um quadro negro a respeito das dificuldades em controlar a mente,
ver o instrutor sorrir com prazer e, quase esfregando as mãos, dizer: “Ah!
Agora as coisas estão melhorando!”
Com sua experiência ele poderá dizer como as coisas vão
indo, inúmeras vezes por detalhes mínimos insignificantes. A melhor atitude,
portanto, e confiar na sua experiência e julgamento, contando-lhe todos os
detalhes a respeito do que está ocorrendo. Um contínuo comentário, feito para
reforçar o próprio progresso, é um grande obstáculo ao verdadeiro progresso.
Algumas pessoas tem a tendência de contar ao instrutor somente o que gostariam
que lhes tivesse acontecido em suas práticas. Omitindo detalhes das
dificuldades e fracassos que consideram não deveriam ter ocorrido — usualmente devido ao orgulho e na vã
tentativa de se iludirem pensando que as coisas estão indo melhor do que na
realidade. Esta atitude não é sábia. O instrutor necessita saber o lado bom e
mau da prática, ele é o melhor juiz a respeito do que é ou não importante.
Inúmeras vezes pequenos detalhes são de enorme importância para ele aquilatar o
progresso do praticante.
Outra fraqueza, muito encontrada entre os Ocidentais ao
praticarem a meditação, sob um instrutor, é o desejo de saberem mais a respeito
da “teoria”: a respei to de “como as coisas vão!”.
Desta forma, eles se enchem de perguntas e objeções
desnecessárias que brotam de pensamentos. Como vimos, o pensar é o oposto da
prática da Concentração. A teoria deve ser posta de lado nesta ocasião. A
melhor coisa é fazer o que manda o instrutor. Como num Império, sua decisão
deve ser final. Ligado a esta questão está a preocupação Ocidental com o
conceito da Psicologia “o tornar consciente o inconsciente” e outros. Com essa
preocupação muitos começam a “olhar” para “erupções no inconsciente”, aos
problemas apresentando-se para solução, e por aí afora. Deve-se frisar que a
análise psicológica não é parte da prática da Concentração. A única finalidade
é ver mais claramente, sem a interferência do pensamento discursivo, aquilo que
É, em cada momento, Agora no presente. A meditação é tranquilização da mente e
a observação do que É desapaixonadamente.Sem nenhum pensamento — não “eu”, nem
“meu”, nem neurose. Da mesma forma que a mente se refresca no sono, ou quando a
terapia ocupacional é aplicada ela se afasta de suas preocupações, ou quando um
dedo cortado é limpo e deixado curar-se pela ação da Natureza, nossa mente
melhor se curará pelo repouso, pela limpeza de estimulantes emocionais e
preocupações. Nada nos afeta tanto quanto a prática da Concentração. Se
continuarmos a prática chegaremos a ver a irrealidade do conceito do “eu” e com
isto destruiremos as bases de todas doenças mentais e tristezas. Não há
qualquer recurso, nem modo de ver as coisas, nem tentati vãs para tornar
consciente o inconsciente que liberem o indivíduo, por exemplo, de sua
“insegurança”, enquanto ele estiver afirmando “eu”, “eu”, corpo e mente nos
quais ele busca a segurança. Eles são impermanentes e nenhuma manobra alterara
este fato ou permitirá segurança. Entretanto, logo que cair a idéia do “meu” no
corpo, todo o problema desaparece. Por esta razão, durante a prática da
Concentração, devemos por de lado pelo menos, a análise psicológica. O “eu”
constantemente pensando em si mesmo é o problema — não suas preocupações, e nem
as formas que toma. A necessidade Ocidental de intelectualizar a respeito da
própria prática de meditação é uma das razões principais porque os Ocidentais
usualmente demoram mais tempo e acham mais difícil do que os Orientais, um
curso de Meditação. Muitos Orientais simplesmente submetendo-se a orientação do
instrutor completam o curso em poucas semanas. A maioria dos Ocidentais costuma
levar o dobro do tempo.
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PASSOS PRELIMINARES NA PRÁTICA DA CONCENTRAÇÃO
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Particularmente aqueles que estão iniciando um período de
pleno treinamento num curso de Concentração deverão, sabiamente, tomar algumas
providências, a fim de que sua prática não seja interrompida. O ideal seria a
pessoa poder tomar um curso completo, sob instrução adequada, durante um
período de tempo indefinido. Em outras palavras: até que o instrutor fique
satisfeito ao verificar que plenos benefícios do curso foram obtidos. De outra
forma, os pensamentos a respeito da aproximação da época da partida e a
sensação de que devemos ter tudo terminado nessa ocasião podem ser obstáculos
de monta para quem medita.
Na prática, entretanto, não é sempre possível dispor de um
período de tempo indefinido, especialmente nas condições desfavoráveis da
cultura Ocidental e na necessidade de atividades para ganharmos a vida. Ainda
assim, mesmo em tempo limitado, a prática dará lucro, se feita com resolução e
espírito correto, pondo de lado os pensamentos de “por quanto tempo terei que
praticar?” e outros semelhantes.
Sempre que possível, a pessoa deve antes da prática por em
ordem sua vida. De outra forma, coisas como, negócios, preocupações
financeiras, aborrecimentos familiares, respostas de cartas, etc., causam
distrações. Durante o período de meditação, devem ser postos de lado todos os
pensamentos que nao estejam ligados à meditação, isto é, ao Aqui e Agora
Durante o período de meditação, devemos tentar viver uma
vida a mais simples possível, cortando dela fantasias e arrebatamentos
desnecessarios. Gastar horas e horas lavando e pasando vestidos de fantasias e
aplicando cosméticos não conduz à boa meditação. Na verdade, a maioria dos
praticantes deverá, sabiamente, tomar os “8 preceitos”, como o fazem os
Budistas Orientais, nessa ocasião. Eles nos levam à renúncia (ao menos
temporária) de coisas, tais como: distrações, diversões, uso de cosméticos,
perfumes, vestimentas elaboradas, etc.
A sofisticação no vestir e na apresen tação, quando vistas
com a devida nitidez, são recursos que a mente utiliza para encontrar uma
sensação de segurança e nos convencer de que somos atraentes e belos. Mesmo sem
essas distrações, a mente estará bastante irrequieta e em certas ocasiões
ansiosa por encontrar “Algo”, em vez de fazer o que lhe parece ser “nada”.
O melhor e deixar o futuro para o futuro (Provavelmente ele
nunca ocorrerá!)! O passado deve ser deixado para o passado!
A mente é muito seletiva a respeito do que ela deseja
lembrar do passado. Da mesma forma devemos evitar toda a conversa e leitura
desnecessarias, bem como andar sem finalidade. Uma boa norma a tomar no período
de prática é: “Coma menos, durma menos, converse menos, medite mais”. Após uns
poucos dias na Prática da Concentração, verifica-se que necessitamos menos
horas de sono. A razão disto é o cérebro, o grande consumidor da maioria de
oxigênio do sangue, que é queimado em energia emocional e tensões que nos
assolam e perturbam física e mentalmente. Tudo é devido à enorme quantidade de
pensamentos carregados de emoção que a mente está naturalmente tratando. Quando
isto é cortado por uma maior autoconsciência na Prática da Concentração,
alcança-se uma Paz e liberdade do constante emocionalismo. Com isto a mente
repousa e é Curada, necessitando, portanto, de menos sono. Uma regra geral
seguida nos mosteiros do Oriente mostra a possibilida de de cortar para 4 as
horas de sono e, logo a seguir, para duas apenas. Eventualmente é muito comum
encontrarmos pessoas que durante dias e dias, ou mesmo semanas. permanecem sem
dormir 24 horas mergulhadas em meditação ininterrupta. Apesar disto não tem
cansaço nem mostram qualquer efeito maléfico e apresentam um bem-estar e
acuidade até então desconhecidos. Para atingir este estado é necessário real
dedicação à prática pelo menos no período em que é praticada. É apenas o início
de uma série de experiências individuais perfeitamente compatíveis para pessoas
que são “homens do mundo”, com um emprego, uma família para zelar e funções da
vida a atender. Acima de tudo, devemos manter nossa vida simples, evitando
neste período conversas desnecessárias, a não ser com o instrutor, e todas as
leituras. Conversas externas tendem a se prolongar na forma de conversas
imaginárias.
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EXERCÍCIO BÁSICO DE RESPIRAÇÃO
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Com essas preliminares e atitude correta da mente, a melhor
maneira para começar a Prática da Concentração é, como o Buda claramente
discorreu no “Discurso à Resposta da Prática de Concentração” (SATIPATTHA
NASUTTA). Devemo-nos sentar e estabelecer a atenção na mais sensível e
constante função do corpo — a respiração. Ela é uma função semi-automática
(SANKHARA) sempre presente em nós na vida normal e completamente neutra do
ponto-de-vista emocional. Por estas razões, é o objeto ideal para aprendizado.
O indivíduo deve-se concentrar e suster sua atenção naquilo que está ocorrendo,
no agora, no presente, no aqui. Muitos acham que a melhor maneira e sentar de
pernas cruzadas. Não necessita, entretanto, ser na famosa “posição do lotus”
com as plantas dos pés voltados para cima, nas coxas opostas, nem mesmo na
posição de “semi-lotus” que produzem em muitas pessoas dores intensas.
A posição simples, “fácil” com as pernas repousando
semicruzadas no chão é perfeitamente suficiente. Podemos colocar para ajudar um
travesseiro estrategicamente, localizado sob um joelho que nos perturbe.
Se não pudermos ficar sentados de pernas cruzadas,
paciência. Isso não é de grande importância. Hoje em dia muitos instrutores de
meditação orientais fazem sua meditação sentados numa cadeira. A única
importante consideração é que devem ter urna postura ereta, alerta, com a
espinha reta que possa ser mantida sem sofrimento durante mais ou menos uma
hora. Enquanto praticamos devemos ficar sentados, imóveis, e relaxados mas
plenamente em estado de alerta. As mãos podem ficar na posição usual,
representadas nas estatuetas do Buda em meditação ou simplesmente uma sobre a
outra, apoiadas na parte superior das coxas. A cabeça deve estar ereta, com os
olhos fechados e todos os músculos relaxados na medida do possível. A posição,
uma vez estabelecida, deve ser mantida, evitando-se reajustamentos
desnecessários na postura.
O local adequado para a concentração da atenção é a face.
Isto varia ligeiramente de pessoa para pessoa. Alguns acham o melhor ponto uma
zona localizada acima do lábio superior. Outros a ponta do nariz. Não importa.
O que importa é que cada um encontre o local onde a percepção da respiração
seja mais nítida. Algumas respirações experimentais permitem estabelecer esse
local em pouco tempo. A atenção deve estar focalizada na sensação física
produzida pelo toque do ar não no conceito da respiração. Não devemos também
interferir com a respiração que deve fluir normalmente. No começo é um pouco
difícil e nos estágios preliminares não é fãcil dissociar a pura atenção, do
controle. Entretanto, neste caso devemos tentar evitar, de qualquer forma, o
desnecessário e não-natural controle da respiração. Devemos respirar
naturalmente, no rítmo normal, com a mente focalizada na sensação do toque do
ar nas narinas. No começo pode parecer difícil a percepção clara da passagem do
ar. O seu “toque” nas narinas. Continue sem dar importância! A prática e
persistência em muito melhorará isso. Devemos tentar ficar consciente da sensação
do ar desde o momento que se inicia a inspiração até o seu término e novamente
do início da expiração até seu fim. Quando inspiramos devemos mentalizar a
palavra inglesa “in” (dentro) Quando expiramos devemos repetir mentalmente a
palavra “out” (fora). Este é um recurso para testar se a mente está fazendo a
prática em vez de sonhar acordada.
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DISTRAÇÕES
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Se uma pessoa não tiver meditado por algum tempo, ela terá
constantemente sua mente afastada da observação na respiração. Pensamentos e
memórias do passado, esperanças e medo do futuro, imaginações fantasias,
intelectualizações da teoria, dúvidas e aborrecimentos acerca de sua meditação,
cenas e formas que surgem diante do “olho” mental, distrações produzidas por
estímulos externos, tais como ruídos, dores, coceiras, impulsos para se
movimentar, etc. Todos eles tendem constantemente para deslocar a mente
levando-a “assuntos laterais” interessantes. Não há necessidade de nos
aborrecer ou ficar desencorajados com isso, pois a mente funciona da forma com
que se habitou há longo tempo. A disciplina começou faz pouco tempo. Roma não
foi feita num dia. Além do mais se fôsse fácil governar a mente encon traríamos
homens iluminados em quantidade. O Buda nos disse que a mente quando começa mos
a querer retirá-la dos seus hábitos maléficos e como um peixe retirado das
águas e colocado nas margens. Agora sentimos as dificuldades na prática. Não
devemos desaninar. Todos encontram ou encontraram essas mesmas dificuldades. Os
homens iluminados são aqueles que não desesperam, perseveram, mantendo a mente
sob controle da mesma forma que um cachorrinho exuberante é paciente, mas
firmemente, treinado a obedecer. Aqui, como em todas as partes, devemos tentar
trilhar o fio de navalha do Caminho do Meio. Deve haver a determinação para
continuar mas uma determinação calma não aquela que se move em arrancos e
paradas entre os pólos do fanatismo e desespero. Isto mostra um forte ego
envolvido na questão (Eu desejo ser um bom meditador). Uma determinação não
tensa é o que se necessita — ou como os comentadores clássicos do Budismo
descreveram, um equilíbrio perfeito entre a paz (SAMADHI) e Ener gia (VIRIYA).
Esses dois, assim como a discriminação (PANNA) e fé (SADDHA), devem estar em
perfeito equilíbrio.
A maneira para tratar essas distrações e noticiar
imediatamente, ou pelo menos tão cedo quanto possível, o fato da
existência da distração identificando-a com a palavra
adequada tal como: “pensar, “ouvir”,“ver”, “dor”, “coceira” ou “impulso”. A
seguir a mente deve voltar a sua ativida de adequada prestando atenção a
sensação da respiração identificando a inspiração com um (in) e a expiração com
um (out) até a próxima interrupção por nova distração. Proceda sempre da
maneira descrita. Quando há qualquer sentimento de irritação na distração ela
deve ser qualificada como “Irritação” claramente identificando com uma etiqueta
o tipo de sensação em causa. Após isso a mente deve voltar a prestar atenção na
respiração. De maneira semelhan te qualquer divertimento — ou por exemplo o
prazer sentido com a velocidade com que captamos e registramos um movimento
centrífugo na mente — deve ser qualificado como “diversão” ou “prazer” e
novamente voltar a atenção para a respiração. Todas as tendências para a mente
peregrinar devem ser anotadas tão cedo surjam. Quando o indivíduo tiver mais
prática pode capturá-las antes que elas nasçam pois ele antecipa-se a mente,
que começa a se movimentar em determinada direção. Não devemos, entretanto,
saltar sobre ela tentando a sua imobilização. A identificação do estado mental
não deve ser nem muito rápida, nem vagarosa de mais, mas sim, firme e claramente
sem superprodução. Quando nos preocupamos demasiado isto só serve para maiores
agitações e distrações mentais. Tal fato está muito bem dito na afirmação: “Não
há necessidade de ter medo dos pensamentos que nascem e sim da demora em nos
tornar conscientes de les” . O perseverar pacientemente na captura dos
pensamentos como quem traz de volta a determinação da posição um cachorrinho
que está sendo treinado toda vez que ele escapulir, e na verdade meditação e
indica que as coisas vão indo muito bem. O que não é meditação é o indivíduo
tornar-se preguiçoso e ficar sentado, imóvel, sonhando acordado, como tambêm
deixar-se tomar pelo aborrecimento e desespero ao ver que a mente não para.
Outra forma de grande distração são os “comentarios
pensados” tais como os pensarnentos: “Bem, neste momento não estou pensando em
nada”, ou “As coisas estão bem agora” e outros semelhantes. Inúmeras vezes eles
tomam a forma de relacionar o que vamos dizer ao instrutor e imaginando, com
antecipação, toda a conversa. Esses pensamentos devem ser simplesmente notados
e rotulados como “Pensamentos” e como o Ven. Mahathera a Huang Po disse:
“deixados de lado como um pedaço de madeira podre”. Convém notar que devemos
deixar de lado em vez de jogar fora. Um pedaço de madeira podre nada está
fazendo para te irritar. Não tem qualquer utilidade, dai não devemos nos
aferrar a ele. O Buda usava a mesma descrição ao afirmar que todos os objetos
(DHAMMA) da mente não são “meus” nem nada têm a ver “comigo” (Como poderiam
ter? São somente objetos e não sujeitos). Não tem, portanto, qualquer
significação como também não têm as folhas e galhos caídos no solo de uma
floresta. Por que preocuparmo-nos com eles? Qual a vantagem em investigar o
lixo que acumulamos para logo o jogar fora? Ao notificarmos todas essas
distrações, bem como a própria respiração, as palavras usadas como
identificação, tais como “in”, “out” são somente etiquetas, rótulos, para maior
qualificação. A finalidade é, em cada caso, obter unia visão clara, em foco, do
objeto em questão. Se nos movimentarmos sem cuidado, com a atenção fora de
foco, ou com a consciência mais na palavra do que no objeto não o veremos,
obviamente, com maior nitidez. Pelo contrário, se nos aferrarmos fortemente a
ele isso perturbará a mente e produzirá mais pensamentos. Novamente convém
lembrar que é necessário, seguir o caminho do meio. É por esse motivo que
constantemente é repetido no “Discurso Para a Prática da Concen tração” que
devemos ficar conscientes do objeto com “a concentração estabelecida” somente o
suficiente para uma clara compreensão e autoconcentração, enquanto permanecemos
desapegados a tudo deste mundo. Não existe qualquer necessidade para tentar
restabelecer ligações numa cadeia de pensamentos associados, nem tentar apurar
o que primeiro produziu essa cadeia. Qualquer impulso dessa natureza deve ser
notado simplesmente como “pensar” e a mente deve voltar a prestar atenção na
respiração. Entre tanto, se coisas más nos perturbarem devemos, imediatamente,
recomeçar o processo de atenção interrompido no único lugar onde é possível —
naquele em que estamos agora e continuar daí em diante. A análise psicológica é
também rotulada como “pensar”. Movimentos involuntários do corpo e membros
durante a prática devem ser notificados da maneira apropriada como “sacudir”,
“movimento”, etc., e a seguir a mente deve voltar a atenção para a respiração.
Verifica-se que, normalmente esses movimentos, bem como dores, coceiras,
desconfortos, cessarão quando notados clara e impessoalmente. Particularmente
no início verifica-se que não param imediatamente sendo necessário notificar
essas distrações por duas ou três vezes, as vezes mais, antes que desapareçam.
Em certas ocasiões, dores, coceiras, caimbras, dormências, tem urna tendência
em aumentar de intensidade quando uma atenção concentrada é focalizada nelas.
Mas se a pessoa continuar a notâ-las, sem paixão, todas as vezes que a mente
for atraida elas começarão a desaparecer. Por essa razão se uma sensação parece
aumentar em vez de decrescer, devemos continuar a notá-la com a atenção clara,
sem emoção, focalizada na sensação atual (real) e não da idéia da sensação; nem
na aversão ou medo da dor. Ela então desaparecerá ou estabilizará. Em primeiro
lugar quando o indivíduo não está plenamente consciente dessa forma, quando lhe
ocorre uma sensação, nasce também o desejo de que ela desapareça. Isso é
mecânico. Nesse mecanismo a mente torna-se atenta, dentre todos os possíveis
objetos em determinado momento, de um que a mente está interessada, O interesse
é de duas espécies: contra e a favor. Gostar e não gostar são igualmente sinais
para a mente trazer um objeto para posterior investigação. Essa é a razão
porque o Caminho do Meio — entre o gostar e não gostar é necessario. Quando
olhamos desapaixonadamente, com equanimidade, a qualquer coisa apresentada pela
mente vemos que: “meu caro, aquilo não tem o interesse que pensei que tivesse”,
e com isso ela abandona o que parecia interessante e passa para outro assunto.
O mesmo ocorre com pes soas. Se alguém vem para te ver e o recebes com afeição
ele ficará para uma longa conversa. Se pelo contrário receberes o visitante,
com agressividade e irritação é quase certo ele ficar para discutir contigo.
Quando, entretanto, o recebermos correta mas friamente, evidentemente não interessados
na vinda, o visitante importuno irá embora. Portanto, uma equanimidade genuína
a todos os objetos apresentados pela mente produz cedo a paralisação de suas
influências incluindo nisso as dores e desconforto. Mas a mente não se engana.
A equanimidade deve ser genuína, ou a mente começará a trabalhar imediatamente.
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MOVIMENTOS
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Nos estágios iniciais, quando uma dor ou coceira não
desaparecem, mesmo depois de repetidas notificações, mas pelo contrário, se
tornam intoleráveis ao ponto de obrigar a pessoa a se mover ou coçar o ponto da
pele onde elas atuam, o indivíduo deve qualificar essa vontade como:
“intenção”. A seguir, voltar novamente a atenção para a respiração. Se, apesar
de ter seguido todo o esquema, notar a dor, a coceira e o impulso de se mover
ou coçar como “intenção” e tiver mesmo que se mover por não suportar mais a
sensação, deve fazer o necessário movimento, qualificando cada etapa. Por
exemplo: se uma coceira na testa tiver atingido as proporções de um martírio e
os repetidos impulsos para nos movimentar, qualificados devidamente como
“intenção”, tiverem sido impotentes para controlar a sensação, devemos lenta e
deliberadamente começar a levantar o braço, e enquanto fizermos esse movimento
contínuo, repetir mentalmente: “levantando, levantan do, levantando...” a fim
de assegurar a perfeita concentração da mente no movimento.
Quando a mão alcançar a testa o toque da unha deve ser
notificado como “tocando” e ação de coçar como “coçando, coçando...”. Quando a
sensação provinda da testa indicar que a coceira está satisfeita, devemos
imediatamente registrar: “satisfeita”, O impulso para recolocar a mão no colo
deve ser identificado como “intenção” e o longo e lento percurso como:
“movendo, movendo...” e por ai adiante. Esta descrição um esquema geral da
coisa, mas, de fato quando tivermos alguma prática nessa técnica, encontraremos
muito mais coisas a notificar nesta simples ação de coçar a testa. Um som pode
distrair a pessoa no momento que começa a elevar a mão, ou um pensamento.
Podemos ter nossa atenção distraída pela modificação da pressão no nosso regaço
ou no antebraço. Quando, num momento de perda de concentração, começamos um
movimento “cego”, não registrado préviamente, a coçar a pele ou qualquer coisa
que envolva um movimento, devemos imediatamente nos reconcentrar, vendo o que
estamos fazendo, registrando: “movendo” ou “coçando” e principiar novamente
deste ponto em que “estamos”. O que passou, passou, e não ganhamos nada em nos
insultar, nem arrebentar em lágrimas, apesar de toda ação provinda de impulso
cego, sem registro, seja um sinal de distração e portanto, em outras palavras,
um fracasso na Concentração. O Buda assim nos indica no “Discurso Sôbre a
Prática da Concentração” ao dizer: “seja dobrando um braço ou esticando,
devemos agir com plena consciência”. Isto é o que significa Concentração: —
prestar atenção naquilo que estivermos fazendo, vendo as coi sas “como elas são
...“ não aquilo que estamos pensando a respeito delas”.
Quando estas ações forem terminadas, a atenção deve reverter
novamente para a respiração. A descrição acima de como considerar uma coceira concentrando-se,
é apenas um dos inúmeros tipos. Todas outras ações para nos mover, se
absolutamente necessárias para aliviar uma dor, engulir, esticar o pescoço,
abrir e fechar os olhos, — todas as ações enfim, devem ser tratadas da mesma
forma. Esta é a Concentração, a maneira “direita”, o único “caminho”.
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DORES E MAL-ESTARES
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Certas ocasiões durante a prática surgem dores, coceiras,
compressões, sensações de dormência, alfinetadas, sensações de que um inseto
está andando sobre a pele, e outras. Elas podem tornar-se proeminentes. Não há
razões para preocupações (ou interesse), pois isso não é sinal de doença. As
sensações brotam de um enorme número de causas naturais. Algumas estão em nos o
tempo todo, mas “normalmente” não somos conscientes delas. Isto pode ser visto
se observarmos a maneira que “pessoas ignorantes, mundanas” mudam constantemente
de posição sem a menor consciência do desconforto como sendo a causa dessa
mudança. Vemos, portanto, como é profundo o descontentamento “DUKKHA”: a nobre
verdade do sofrimento : Mesmo modificar a posição como as pernas estão cruzadas
é um sinal disso. Se estivéssemos satisfeitos não mudaríamos de posição. A
maioria das sensações que cos tumam ocorrer na meditação são devidas aos
períodos prolongados, a que não estamos acostumados em que ficamos quietos
sentados enquanto a mente e músculos estão ainda tensos, lutando contra si
mesmos, não tendo alcançado ainda o estado de relaxamento (PASSADHI). Uma
grande paz mental traz sempre consigo um maior relaxamento nervoso e muscular,
eliminada a causa do desconforto. Mas por algum tempo, enquanto isso não ocorre,
temos que suportar concentradamente e sem revolta os efeitos acumulados. Outras
sensações são psicossomáticas ou produzidas pela mente condicionada durante
anos de saltitante atividade, pulando de um tópico “interessante” para outro
como um gafanhoto sem se preocupar da realidade do objeto. Desacostumada,
portanto, a prolongada atenção a coisas tão desinteressantes e monótonas como a
nossa respiração, a mente se aborrece e tona se inquieta criando diversões para
sua própria distração. É “MARA”, em ação, o princípio do Mal, tentando que
abandones o interesse na Prática da Concentração. Entretanto, como tem sido
descrito, se os truques da mente forem prontamente identificados, simples e sem
emoção, como: “coçando”, “sentindo”, etc, MALA nos deixa e vai embora: Da mesma
forma que as suas três filhas quando fizeram tudo para tentar o Buda que
firmemente recusou-se a reagir de uma forma ou de outra.
Em certas ocasiões pode nos parecer que ruídos, sensações e
distrações nos afetam mais do que em outras. Um tenue ruído pode nos perturbar.
Não devemos nos aborrecer com isso. Tudo é normal e constitue o caminho que
teremos de trilhar. Há, entretanto, períodos em que nos tornamos mais
vulneráveis, mais facilmente irritáveis, desencorajados, etc. Também é natural e
é somente um estágio que cedo será ultrapassado a medida que continuamos. A
causa desse estado de coisas e a crescente atenção em pequenos impulsos que
antes passavam desapercebidos. A melhor focalização neles faz com que cada um
receba uma energia adicional. Quando, entretanto, os notamos tranquilamente da
maneira descrita o efeito é momentâneo e cedo passará. Se continuamos na
prática, com firmeza, chegaremos cedo a um estado onde, pelo contrário, cada
estímulo, embora visto com maior claridade, possui algo parecido a um
absorvedor de choques. Com isso coisas que antes nos fariam “subir pelas
paredes” nos deixarão calmamente repetindo: “ouvindo” “ouvindo”, etc. etc..
Se enquanto praticamos a atenção na respiração a mente notar
formas imaginárias, cores, luzes, rostos de pessoas, eles devem ser notados
como “vendo” sem qualquer interesse ou aversão e a mente deverá logo voltar sua
atenção para a respiração.
Apesar de belo como um tapete persa ou um caleidoscópio a
imagem diante de nos a melhor coisa a fazer é notar como “vendo” e passar
adiante sem nos preocupar com detalhes. O “controle dos sentidos” é descrito no
Budismo como “vendo um objeto, nao devemos ser capturados pela sua forma ou
detalhes”. O mesmo deve ser feito em relação a qualquer outro sentido. A ordem
do dia na Prática de Concentração é: “naquilo que se olha ver somente o que se
vê”. (DITTHE DITTHAMATTAM). Em outras palavras “vendo” e passar para diante sem
morar no objeto. Quando a mente “mora” em alguma coisa a prática de
Concentração cessa. Torna-se então escrava do objeto.
Esta prática do Exercício Básico Respiratório deve ser
mantida por períodos de uma hora (ou o que o instrutor recomendar). Entre as
sessões os exercícios básicos de andar devem ser praticados em períodos
horários. Devem ser alternados com o exercício respiratório.
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EXERCÍCIO BÁSICO DE ANDAR
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Entre as sessões da prática sentada,o meditador deve
procurar me local tranqüilo, onde possa caminhar de lá para cá sem ser
perturbado. Não precisa ser muito longo. Mesmo o nosso quarto, se não for
pequeno demais, pode servir. Ou um corredor, jardim, salão, etc. O melhor neste
exercício é que caminhamos mais lentamente do que o fazemos normalmente. A
marcha deve ser, entretanto, tão simples e natural quanto permita sua
velocidade. Se ocorrer alguma dúvida quanto a isto, o instrutor poderá dar uma
demonstração. Durante o período de andar, de lá para cá, a atenção deve estar
fixa no movimento das pernas e pés. Devemos notar, a medida que o pé direito
começar a levantar do chão: “levantando”. Quando ele se movimentar para frente:
“movendo”. Quando pousar no chão: “pisando”. E o mesmo para o outro pé.
De forma exatamente igual à prática sentada, todos os
pensamentos e sensações que nos tentam distrair devem ser notificados e postos
de lado. Pode acontecer a pessoa olhar alguma coisa e neste caso deverá
registrar imediatamente: “olhando” e reverter sua atenção para o movimento dos
pés. Olhar para os objetos e notar seus
detalhes, mesmo para aqueles que estão no caminho, é o “desejo dos
olhos” (RUPARAGA) Esse desejo não faz parte da prática, embora devemos
registrar “olhando”, se inadvertidamente o fizemos. O resto são “visões
interessantes”, iscas do anzol de MARA (ilusão).
Ao atingir o fim do caminho há necessidade de girar e
caminhar na direção oposta. Temos a consciência disso quando falta um passo ou
dois para atingir o limite da caminhada. A intenção para fazer a volta deve ser
identificada como “intenção” No começo é difícil prestar atenção, pois a volta
se faz quase automaticamente. Devemos, no entanto, notar o pensamento a medida
que ele ocorre. Neste caso, a intenção existindo, pois a concentração está
firme, ela será vista e anotada. Após anotar a intenção de fazer a volta,
devemos anotar todos os pormenores dos pensamentos e movimentos envolvidos
neste giro. À medida que damos o último passo para frente, começaremos a girar
o corpo, devendo então anotar o fato como “girando”. Quando o pé estiver se
levantando, imediatamente anotar “levantado”. Procurar identificar todas as
fases do giro até a retomada ao caminhar lento de volta. Há inúmeras vezes uma
tentação de chegar ao fim do caminho dar uma olhada em alguma coisa
interessante. Se este impulso indisciplinado ocorrer deve ser anotado como
“intenção”. No caso de a visão distraída tiver ocorrido devemos anotar
imediatamente “olhando” e a atenção revertida naturalmente ao movimento dos
pés. Não há necessidade, em tais casos, de forçar a mente de volta aos pés.
Logo que a concentração é restabelecida a mente, por si própria, sabe o que
deve fazer e, automaticamente, dirige-se a isso. O mesmo é verdadeiro em outras
ocasiões durante a Prática de Concentração.
O melhor para principiantes é começar o exercício de andar
com uma técnica de anotar 3 estágios: “levantando”, “movendo”
e “pisando”. Dependendo da capacidade de quem medita o
instrutor pude recomendar o registro de mais ou menos estágios. Em certas
ocasiões, por exemplo, quando por motivos práticos não for aconselhado andar
vagarosamente, recomenda-se a marcha normal sendo suficiente registrar
“esquerda”, “di reita”. Isto pode ser feito nas ruas, quando um caminhar em
marcha lenta espantaria qualquer pessoa por mais fleugmática que fosse. O ponto
importante não é quantos pontos estão sendo anotados, mas se estão sendo
efetivamente registrados, obrigando a mente a abandonar sua atividade normal de
“saltimbanco”.
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DURANTE AS AÇÕES DIÁRIAS
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As duas práticas, Respiração e Caminhar, constituem a base
da Prática da Concentração, sendo adotadas como uma “técnica” ou
particularmente durante um “Curso”, quando podemos organizar nossa vida, de tal
forma a termos tempo para meditar.
Mesmo durante um curso de meditação há um número de ações
diárias que permanecem. Temos que nos levantar, lavar-nos ir ao banheiro, fazer
nossa cama, comer ficar de pé, sentar, etc. Durante todas essas atividades,
devemos adotar uma prática semelhante. Na verdade, não há diferença essencial
entre a Prática de ficar sentado, fazendo o Exercício Básico Respiratório, e
estar sentado, fazendo nossa refeição. Somente quando estamos sentados, fazendo
o exercício respiratónio, o que ocorre é simples e regular, portanto, mais
fácil do que quando somos obrigados a anotar urna série de ocorrências. Esta é
a razão pela qual se escolhe inicialmente a posição sentada para prática.
Durante as ações diárias, o mesmo esquema essencial é seguido. O que estiver na
mente deve ser visto e anotado sem nos aferrarmos a ela. Após longa experiência
na prática, mesmo este simples teste, a fim de verificar se a concentração não
foi perdida, pode ser posto de lado. A pessoa vê simplesmente com uma
consciência silenciosa, mas implícita, cada objeto com que se depare. Isto não
será fácil, principalmente enquanto a mente tentar caçar sombras. Até que
obtenhamos grande experiência e progresso na Prática da Concentração, será de
bom alvitre manter o registro explícito dos objetos da forma indicada.
Será interessante, a quem medita, ler neste ponto o
parágrafo do “Discurso Sobre a Prática da Concentração”, no qual o Buda indica,
em resumo, como a prática deve ser mantida nas menores ações da vida, o
seguinte: “Quando indo ou vindo, o Bikku age somente em plena consciencia. Seja
olhando para frente ou ao redor, ele age com plena consciência. Seja
flexionando ou esticando o braço, ele age em plena consciência. Ao vestir o
manto, segurar sua tigela, ele age com plena consciência. Seja defecando ou
urinando, ele age em plena consciência. Seja de pé, sentando, repousando, falando
ou silencioso, ele permanece plenamente consciente”.
Este pequeno parágrafo fala por volumes de textos! Curto,
incisivo e estilizado para facilitar a memorização, ele enfatiza as importantes
características da vida diária, na qual todas as ações devem ser incluídas —
mesmo a resposta aos apelos da natureza. Serve para frisar que nada (NADA
MESMO) é trivial ou sórdido em demasia, para que não nos concentremos nele.
Este discurso foi feito para os monges (BIKKHUS), daí serem mencionados objetos
e atos normais de suas vidas. A rotina de procurar a próxima vila, pedindo
esmola pela manhã, carregando todas as suas posses — manto tigela, agulha,
etc., comendo o que lhe puserem na tigela, passando o resto do dia, seja
“sentado ou andando” em meditação, não sendo, portanto, uma surpresa os artigos
e ações aqui descritos. O Buda, entretanto, não enunciou estas regras somente
para monges. Elas servem para todos os que tomam sua religião seriamente. Um
antigo comentário a este Discurso adverte como algumas mulheres, dirigindo-se
ao poço da aldeia para apanhar água, devem praticar a Concentração.
Ao aplicar a prática da Concentração durante essas pequenas
ações será melhor se a ação for feita lenta e deliberadamente quanto possível,
a fim de permitir que a ação seja notada claramente, em todos os detalhes, sem
apressar a mente, o que iria causar somente distrações e o aparecimento de
pensamentos associados. Quando praticada de maneira adequada, a Concentração
conduz diretamente a tranquilidade mental ( SAMADHI). Sua colocação como
estágio anterior ao SAMADHI na Nobre Senda Óctupla claramente indica tal fato.
O SANADHI momentaneo não é somente obtido na meditação imóvel, em transe, mas a
tranquilidade e silêncio da mente como um estado mental deve ser preservado e
mantido através de todas as atividades da vida. Neste estágio a pessoa, tendo
parado o fluir do pensamento es tá “livre da inundação” (ASAVA KKHINA). Assim a
prática deve principiar desde o momento que despertamos e começamos a notar a
sensação do peso do próprio corpo de encontro a cama, que deverá ser rotulada
como “sentindo”. A seguir, quando tivermos vontade de afastar a coberta que nos
cobre, devemos anotar: “intenção”. Quando afasta mos a coberta será: “movendo”,
e assim por diante. Este procedimento deve ser feito com todas as ações: ao
lavarmos o rosto mastigando a comida, evacuando-a depois de digerida, escovando
os dentes, etc. Ao vermos algo, devemos notar: “vendo”; ao ouvir: “ouvindo”; ao
cheirar: “cheirando”; ao provar: “provando”; ao sentir urna sensa ção física:
“sentindo”; ao pensar: “pensando”; quando encolherizados: “cólera”; quando
querendo algo: “desejando”; quando alegre: “rindo”; etc. A autoconcentração
deve ser constante. Pode parecer a muitos que isto seja uma prática dura
demais, porém devemo-nos lembrar ela nos leva à Pérola de Grande Preço. Além
disso, não há outro caminho. Isto,
aliás, foi muito bem dito pelo autor da Imitação de Cristo 111.3.2, ao afirmar.
“Por um pouco de dinheiro algumas vezes surgem vergonhosas disputas. Os homens não
se cansam de lutar, dia e noite, por assuntos vãos. Mas pela recompensa
suprema, a mais alta honra, eles se lamentam pela menor fadiga”. Este esforço
conduz, entretanto, a maior paz e felicidade. Mas para alcançá-las cada um tem
que pagar o preço, primeiramente.
Na medida do possível, todas as ações devem ser feitas,
concentradamente, incluindo na prática coisas como ler, escrever, falar, ouvir,
procurando descrever com detalhes todas elas. Vamos tomar mais um exemplo — o
caso de comer. Sentando-nos a mesa para comer, o primeiro impulso deverá ser
pegar a faca e o garfo. O impulso deverá ser registrado como “intenção”. Caso
não seja visto iremos “cegamente” pegar a faca e o garfo. A seguir ao impulso
devemos começar segurando o garfo e levá-lo, lento, à boca. Enquanto isso
notamos: “leantando”, “levantando”... Ao tocar os lábios devemos anotar:
“tocando”; ao mastigar devemos anotar: “mastigando”; ao sentir o gosto:
“provando”; ao engolir: “engolindo”; etc... Ao segurar a colher para mexer o
chá devemos anotar: “mexendo”, “mexendo” etc... Quando noticiamos pensamentos e
ruídos, devemos notar: “pensando” ou “ouvindo”, e a mente deverá voltar as
ações. Entre tais ações, a mente deve repousar na sensação da pressão do lugar,
onde estivermos sentados. Longe de serem “distrações” ruídos diversos, tais
como, ruídos de motores do trafego, aviões, tic-tac de um relógio tornam-se
objetos perfeitamente satisfatórios de meditação.
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EXERCÍCIO ADICIONAL RESPIRATÓRIO
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Após algum tempo a mente torna-se mais calma. Habitualmente
uma pausa ocorre entre a inspiração e a expiração. Nesta inesperada parada a
mente tende a hesitar sentindo não ter qualquer objeto para se concentrar. Tem
então a tendência de vaguear. Quando está parada ocorre deve-se permitir a
mente sentir uma ou duas sensações que estão sempre presentes no corpo. Deve-se
notar, por exemplo, a posição geral do corpo, como um todo, sentado quieto na
prática. Isto deve ser anotado como “sentado”. Então a sensação da pressão do
chão ou assento da cadeira, sob as nádegas, a pressão das pernas sobre as coxas
se estivermos de pernas na posição do lótus Tudo isso deve ser anotado como:
“sensação“. Deste modo uns mais pontos a serem anotados devem ser registrados
para preencher o vazio verificado na parada respiratória. Essas notificações
devem ser feitas sem pressa, naturalmente, com uma velocidade confortável, nem
apressada demais, nem lenta, o que poderã provocar pensamentos que distraem. A
melhor maneira é tomar as sensações mais proeminentes ou, se tiver alguma
constante, tal como o ruído de um avião que passa, ou carro, isso deve ser
notado como “ouvindo”, juntamente com outros pontos de sensação, antes que a
mente volte à respiração no início da próxima inspiração ou expiração. Assim,
tão longa seja a pausa na respiração a pessoa continuará a preenchê-la, notando
os diversos pontos de sensação. Algumas vezes a pausa pode ser mais longa —
mesmo de vários minutos sem respirar, num estágio mais avançado, durante os
quais devemos preenchê-la com a anotação desses pontos proeminentes de
sensação, até que sobrevenha, naturalmente, a próxima restpiração. Com esse
objetivo alcançado de 3 a 5 pontos, sensações marcantes são suficientes.
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DURANTE A VIDA DIÁRIA
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Ninguém pretende que a prática de Concentração durante a
vida diária seja fácil — particularmente nas condições existentes nas grandes
cidades modernas. necessário um esforço sustentado, considerável para manter o
nível de consciência mental e suportar a constante força centrífuga atuando
sobre nos. É um esforço que a maioria não está, talvez, preparada para
suportar. Sem essa consciência intensificada e o autodomínio que nos dá a
Concentração, a vida degenera num tropeçar constante no terreno áspero das
mutáveis condições que o fluir do karma (KARMA) traz aos nossos pés. A evolução
humana deve ser para cima, na direção de uma maior consciência e da
autoconcentração. Evolua ou morra uma lei da Natureza e certamente um homem sem
Concentração está vivendo uma morte viva, envolvido com fantasmas e lutas sem
proveito. O Buda disse certa vez: “Os concentrados não morrem. Os descuidados
estão como se estivessem mortos” Seria agradável ficar sentado,
preguiçosamente, e levar uma vida fácil, mas isso equivale a um sonho de quem
fuma ópio. Nossas mentes não nos deixam repousar até que tenhamos vencido a
“vitória da vida”, isto é: a vitória sobre o Anseio e a Ignorância. Queremos
estar a vontade, “livres”, mas para que isso seja possível depende que o
queiramos ser. Se quisermos ser livres da autodisciplina a fim de “gozar” os
objetos dos sentidos, isto meramente mostra que nos somos escravos dos
sentidos, e o intelecto é um sentido entre outros. Se, de outro lado,
desejamos nos libertar da escravidão dos sentidos para alcançar autodomínio e
autorealização, esta é a verdadeira liberdade. E ela é possível. É a Paz, a
Verdade, a Vida mais abundante e a Libertação.
A prática da Concentração na vida diária tende a parecer
mais difícil do que é, em virtude de duas razões principais. Primeiro: o
indivíduo não está acostumado a ela e, portanto, quando começa, com entusiasmo,
a tentar a prática de um grau maior de Concentração na vida, verifica que um
bom impulso começa a perder força em face de falta de cooperação do mundo e
vai-se encontrar, aparentemente, onde começou. Isto pode ser em grande parte
contrabalanceado se a pessoa já certa vez sentiu o “gosto” do caminho, ou seja,
já provou o que significa estar concentrado, por exemplo, durante um período de
Curso de Concentração em tempo integral, sob a orientação de um instrutor
adequado. Os efeitos desses cursos, se periodicamente renovados, auxiliam a
manter o momento. Devemos esperar que sobrevenham éocas de aparente fracas só
completo na Concentração. A coisa importante é não perder a coragem e
recomeçar. Há um refrão que diz: “Os ingleses perdem todas as batalhas, menos a
última”. Isto não é verdade, historicamente, mas é algo que pode ser dito,
espiritualmente, a respeito daquilo que é o mais santo nos homens. Outra razão
de que parecemos ganhar pouca dianteira, mesmo a despeito dos nossos esforços
na prática da Concentração, e devido ao inveterado hábito humano de tentar ter
o seu bolo e comê-lo. A “Vida Santa”, seja com um manto ou sem ele nas nossas
costas, demanda renúncia, um volver do mundo, isto é, dos sentidos. Não
significa correr deles, nem a sua rejeição, mas a falta de interesse neles.
Como já foi dito, como num refrão no “Discurso da Prática da Concentração” —
“abandonar os desejos e aversão ao mundo”. Esta ”Sagrada indiferença” é a
entrada segura para a Concentração adequada. Com ela ninguém pode nos distrair,
nada pode captar nosso interesse, nem pensamentos sensuais, irritações dividas
e uma hoste de pequenos pensamentos e memorias que constantemente invadem
a mente. Esta retirada emocional, a renuncia no interesse,
das coisas condicionadas, não interfere, de modo algum, com nossa habilidade em
preencher as funções necessárias na vida. Ao contrário, a paz e a claridade da
visão trazem muito maior eficiência em alegria e liberdade no conhecimento de
que “não sou eu quem age”.
Nenhuma prática é tão adequada para aplicação na vida diária
como a Prática da Concentração. E uma prática que pode e deve ser mantida em
todas as épocas, nas mais variadas circunstâncias. Diz-se que, assim como o sal
serve em todos os temperos, a Concentração adapta-se a todos os evvntos.
Relembro a famosa história Zen, do mestre a quem perguntaram como a pessoa
devia viver e que respondeu: “Quando com fome, comer. Quando cansado,
descançar”. A essa resposta o interlocutor argumentou: “Mas, esta é a maneira
que todos vivem!” (O Mestre, tranquilamente, explicou: “A maior parte das
pessoas quando comem não estão comendo e sim pensando toda a sorte de imagens e
pensamentos, sem sentido”. Esta é a diferença entre viver com ou sem
Concentração.
Muitas pessoas dizem: “Não tenho tempo para praticar
meditação. Sou um homem muito atarefado”. Não ter tempo para ser
mais consciente ? É uma afirmativa estranha! As pessoas tem
medo de que a prática da Concentração, durante o trabalho, interfira com ele.
Na realidade é o contrário que acontece. Vamos olhar, entretanto, para enorme
quantidade de tempo “perdido” diariamente. Levantar, vestir, o que pensamos
quando dirigimos ou estamos sentados na nossa condução? Será útil espiar os
anúncios que passam e as pessoas a nossa volta? Fazendo os trabalhos caseiros,
o que pensamos? Devemos varrer quando varremos, lavar quando lavamos, comer
quando comemos, etc.
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DEIXE AS COISAS SEGUIREM SEU CURSO
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As pessoas tem um quase instintivo pavor de que, a não ser
que “pensem” e mantenham o “controle das coisas” elas esquecerão algo
importante e as coisas se tornarão erradas. Na realidade, nem a quarta parte
dos pensamentos que enxameiam nossas mentes preocupadas é funcional. O resto
(3/4) são pensamentos “gafanhotos”. Se as condições são tais para que certa
ação seja tomada, anos de condicionamento assegurarão que o impulso ocorra e a
melhor maneira é ficar tranqüilo e concentrado, em vez de submerso numa
enxurrada de memórias, esperanças, aborrecimentos e preocupações. Confiar na
Lei de Karma, na Lei do Condicionamento, ver as coisas tomando lugar, seguro na
realização de que “esta agindo por meu intermédio”, “e sou apenas o
instrumento”, é a muito mais feliz e concentrada maneira de viver. Naturalmente
a resistência do apego e o véu do sentimento errôneo de “estou agindo” causam o
fluir dos pensamentos de forma indisciplinada. Maior concentração traz paz,
liberdade de emoções errôneas, claro julgamento e senso real de bem-estar.
Matai os dois gigantes que habitam na selva das nossas mentes: o Desejo (TANHA)
— através da paz e liberdade de ansiedade e emoções maléficas (Alegria, boa
vontade, compaixão, permanece) e a Ignorância (AVIJJA) — desapareçe pela
claridade da visão e a crescente consciência da verdade do não-ser, (ANATTA).
“Isto não e meu! Isto não é o que sou. Esta
não é minha natureza real”. Em outras palavras: “Estes
objetos nada tem a ver comigo”. “De maneira alguma tocam meu verdadeiro ser”.
“Eu não sou quem faz essas ações”. É a ignorância que nos faz identificar com
“nossas” ações e toma a responsa bilidade delas em nossos ombros. Desta forma
nos amarramos à Roda do Condicionamento. A constante Concentração da Sabedoria
nos libera! Ou melhor, mostra que nunca estivemos presos, exceto em PENSAMENTO!
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POSSAM TODOS OS SERES SER FELIZES
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